Ativo desde 2021, Canary Complex é o projeto solo de Canary Kasey, guitarrista da banda americana Flood District. Ele é um entre tantos artistas internacionais inspirados pela sonoridade do visual kei.
Como no Brasil, França e Chile, os Estados Unidos também possuem sua parcela de fãs do gênero que por ele são arrastados para o mundo da música. O caso de Kasey é pessoalmente comovente, porque é nítida as inspirações de muitas bandas que a geração que conheceu o visual kei nos anos 2000 se apaixonou: Malice Mizer, Luna Sea, Kuroyume, Shazna, BUCK-TICK, quem ouviu e amou qualquer um desses, sentirá uma familiaridade aconchegante em A Whisper of Spring.
SOBRE O ÁLBUM: A Whisper of Spring
Corsets Fall dá bom exemplo do nome do álbum, com inspirações sonoras primaveris que lembram os sons de um Malice Mizer em tempos de Merveilles. Ao mesmo tempo, você tem uma inspiração bem interessante de X, com baterias rápidas cujos ritmos lembram a bateria de Yoshiki Hayashi.
A base de The Face of God é sustentada por um violão, com uma progressão melódica bem típica de várias músicas do universo do visual kei. Enquanto Déshabillez-Moi presta uma bela homenagem a Aegen para todo bom e boa entendedora. Nessa música, Canary Kasey demonstra um bom domínio dos delays, reproduzindo com boa fidelidade fraseados como os de Közi em Le Ciel ou de Sugizo em tantas músicas do Luna Sea, como a In Silence ou Moon.
As músicas seguintes do álbum seguem uma tônica mais badalesca. Serance possui uma forte pegada emocional, já Hyacinthine tem um ar parisiense, com usos de acordeões evocando os típicos cenários que inspiram visuais lolita e/ou vitorianos. Papillon ~Snow Angel~ possui um easter egg maravilhoso! Digo isso porque é perfeitamente possível cantar Fly Me To The Moon na primeira metade do compassos de seus versos. Até Júpiter e Marte, pelo menos. E sejamos sinceros, num álbum chamado “Um Sussurro de Primavera”, é bem difícil uma alusão a um clássico que canta “deixe-me ver como é a primavera em Júpiter e Marte” ser mera coincidência. Pontos pela criatividade!
A sessão de baladas é encerrada com Pierrot (deep sky), com um interessante e atípico uso dos cantos da caixa da bateria para compor o ritmo da música. Essa é uma qualidade geral do álbum, por sinal. Entre androginias e idosos de calcinha(?), muitos acabam fisgados pelo visual kei porque, como em tantos outros gêneros da música japonêsa (city pop, math rock, indie), até as coisas mais simples são bem mais elaboradas e menos “retas”, por assim dizer”, do que o 4/4 nosso de cada dia. Quem explica isso como ninguém é Marty Friedman, ex-Megadeth (e a Cadence Hira, mas essa é pra quem é nerdão de música). It’s Up To You fecha o álbum com aquela energia de fim de show, como costuma ser o caso. A canção vem como um leve gosto de Shazna à mente, que é justamente uma ótima referência de banda com uma energia empolgante.
CONCLUSÃO
Pela enxurrada de referências citadas, existe a chance remota, mas nem por isso nula, de que esses comentários sejam lidos como um demérito ao Canary Complex. Nada mais distante dos fatos. Houve tempos onde éramos mais puristas. E falo isso num contexto sim, de visual kei. Era muito comum caçoar de bandas por serem cópias do DIR EN GREY, por exemplo. Claro, algumas eram mais descaradas; outras menos. O que essa obsessão pela tal da originalidade não enxerga, é que parte da diversão de fazer música é a oportunidade de entrar em contato com os sons que você cresceu admirando, reproduzindo-os no palco e nas gravações.
Ora, é inesquecível a alegria no rosto do Mia, do Nazare, quando no dia do seu show do Rio, comentei em tom de brincadeira que ele era baixo igual o Kyo, vocalista por ele tão admirado. Não há problema em sermos inspirados! Não há problema o Luna Sea pegar tantos trejeitos do DEAD END nos seus primeiros anos! Em 1989 pra 1992, eles eram influenciados pela suas referências da época. 35 anos depois, é impossível imaginar o visual kei sem influências pesadas do Luna Sea!
É nessa seara que acho tão digno de elogios o A Whisper of Spring. Seu carinho e cuidado com a criação dos sons e das canções evidenciam o impacto positivo que Mana, Közi e Yu~Ki tiveram na carreira desse artista, que vem enveredando em seus caminhos nos últimos 4 anos. Pode ser que não agrade aqueles que prefiram músicas mais agitadas, sendo baladas o grosso do álbum, mas não deixa de ser uma produção bem feita e com evidente zelo!
Resumo da ópera: É fã de Malice Mizer? Ouça com gosto!