Um dos jogos mais aguardados do ano, o oitavo capítulo da franquia clássica de Horror e Sobrevivência, hoje lhes trago, sucolinos e sucolinas, Resident Evil Village, que também apelidei carinhosamente de RE: Village, uma sequência direta de Resident Evil 7 Biohazard e que traz novamente Ethan como protagonista.

Assim como nos últimos anos e desde RE7, mais uma vez temos a RE Engine colocada à prova, e que apesar dos belíssimos gráficos (ainda assim, não considero “nova geração”), temos uma gameplay com ótima fluidez e desempenho até em máquinas mais modestas – aqui, falando especificamente em PCs de entrada.

Multiplataforma, lançado para PlayStation 4, Xbox One, PC, PlayStation 5 e Xbox Series X|S, sua performance não é muito diferente de um console se comparado lado a lado da antiga e nova geração. Se você ainda não juntou seus trocados – no Brasil, trocadões! – para adquirir um console next-gen, adianto que os gráficos estão ótimos e combinam bela performance num PS4 ou XONE*.

*Vale lembrar que você pode atualizar sua versão digital de PS4 ou XONE para PS5 e X|S gratuitamente. 

Resident Evil Village
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O Bebê Rosemary

Saindo um pouco da parte mais técnica, vamos comentar sobre sua história e de como sua trama é apresentada. Sem dar muitos spoilers e não adiantando muito o conteúdo que já foi mostrado em DEMO ou trailers, temos um roteiro que inicia três anos após RE7, com os sobreviventes da Louisiana, Ethan e Mia Winters.

A novidade agora é Rosemary, que diferente do filme, não é a “Mãe” da vez, e sim, a própria criança, também chamada comumente de Rose. Em meio a um clima de família feliz, o casal foi “movido” para um lugar – não especificado no jogo – na Europa, mas que se parar para analisar as construções do vilarejo, cenários e geografia, é nitidamente o Leste Europeu, algo como Romênia, Hungria e Polônia. A primeira citada, minha maior aposta, e vocês entenderão mais adiante…

Voltando, após uma breve introdução onde levamos a criança até o berço, passamos por cômodos onde encontramos documentos, fotos e até livros; um destes, revela que Ethan fez um treinamento militar, o que demonstra estar mais apto para futuros confrontos – o que de fato se comprova.

No término desta introdução, temos Cris invadindo a casa dos Winter e assassina sua esposa. E assim começamos o jogo sem entender nada e sua narrativa se torna procedural até os últimos instantes da jogatina.

Resident Evil Village
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Evolução Narrativa e de Protagonismo

Referências do 7? Sim. De outros jogos da franquia? Também! Novos elementos narrativos que modificarão toda a história da franquia? Com certeza! 

A primeira “coisa” notável no jogo é de como Ethan evoluiu bem na história. Com ajuda da dublagem – a brasileira fez um ótimo trabalho aqui – o personagem está mais carismático e até mesmo faz algumas brincadeiras em tela, onde muitas vezes sai do vitimismo/caça, para um lado mais Caçador, batendo e respondendo de frente os vilões do jogo.

Não levando desaforo, temos um Ethan corajoso e que traz uma nova técnica em sua jogabilidade, onde levanta Guarda, contra ataca com Chutes e dispões de um caminhar mais arrojado do que tínhamos no capítulo anterior. Pode-se dizer que após uma estreia “morna”, Ethan já figura como um dos personagens emblemáticos da franquia – mesmo sem ver o seu rostinho lindo…

Com relação a como sua história é contada, não há grandes complicações e sua linearidade facilita o bom entendimento da trama e de como ela se conecta com outros jogos ou com a lore em si – vide BSAA ou Umbrella – com a ajuda de Cris, que retorna a seu estágio mais “humano”, sem aquela montanha de músculos dos anteriores. Na verdade, passei a ter uma afeição novamente ao personagem depois de muitos anos…

Resident Evil Village
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Jogabilidade

Podemos dividir o jogo em 5 ou 6 grandes capítulos, a começar com a introdução e de como vamos parar na Vila, passando depois por quatro chefes e seus cenários, até culminar num epílogo todo hollywoodiano, onde o jogo escancara todas as respostas que você queria – ou não – saber. Atente-se às cenas pós-crédito. 

Gosto de como todos os capítulos são trabalhados, os personagens apresentados – mas nem todos bem trabalhados – e de como as nuances da jogabilidade são exploradas, passando um ar comemorativo aos 25 anos da franquia da CAPCOM. É fato que quiseram agradar todo mundo, e bem, acho que conseguiram.

Considero Resident Evil Village uma mescla de dois jogos: RE4 e RE7. Se você gostou destes dois, é bem provável que estará familiarizado com tudo aqui apresentado e que potencialmente irá tirar um bom proveito na jogatina. Para os jogadores mais antigos, acostumados com Policia x Zumbi, sinto lhe informar que há pouco dos ingredientes daqueles primeiros jogos, mas a cereja, o cerne do que faz um jogo ser Resident Evil, está aqui, sem sombra de dúvida.

Mesclando Ação com Estratégia, devemos economizar suprimentos e munição, onde a Maleta retorna no lugar do Baú, o que te dá a sensação de auto-controle total, sem depender em chegar em uma sala específica para ter acesso a um item ou arma – o que pode te causar problema também; seja responsável.

Um fator importante e marcante em Resident Evil Village já está em seu título: A Vila. Com muita referência no filme A Vila (a vá), Silent Hill, e até arrisco a dizer no longa A Escuridão (The Dark, 2004), a localidade serve como um hub para as demais áreas do jogo, funcionando de forma bem similar a Majula, em Dark Souls 2. Ao término de cada capítulo, normalmente retornamos ao ponto central, recarregamos nossas energias, farmamos munições e damos aquela respirada para seguir em mais uma “Aventura”, como diria o personagem Duque.

Com boas conexões, algo característico da franquia, temos a possibilidade de revisitar boa parte das regiões após terminar sua trama principal, o que garante um elemento de Exploração não muito visto na série e que talvez a CAPCOM esteja testando por aqui para aplicar com maior ênfase em títulos futuros. Ainda não sei bem se gostei da mecânica de Caçar Animais para obter alimentos que aumentam a Vida ou melhoram a Defesa. De fato, não tenho uma posição bem definida com esta questão.

Já no que diz respeito a Puzzles, eles estão presentes, obviamente, mas nada tão absurdo que te faça caçar na Internet – não falo de Segredos, apenas Puzzles. Um dos capítulos, assim como em RE7, do Lucas, é focado na resolução de enigmas; outro, na resolução de liberação de caminhos. Estes são os mais longos, porém, o mais interessante em minha visão, é o desafio dos Sinos, que é praticamente de Observação.

Resident Evil Village
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A Escuridão vai te acompanhar!

O jogo é escuro. Muito escuro. Apesar de não ser o BREU do que foi RE7, em Village temos um trabalho gráfico bem superior e com ajuda da RE Engine, os efeitos de Sombra e Luz estão bem aplicados com o Ray Tracing – se não me engano, este é o único jogo da CAPCOM além de DMC5 a utilizar tal tecnologia.

Com saves rápidos e telas de carregamento praticamente inexistentes para quem joga em SSD, a fluidez se mantém durante grande parte da jogatina com poucos momentos de queda de quadros; em minha experiência, algumas animações são instáveis ou muito pesadas em sua renderização. Quem sabe com algum patch tenha alguma melhoria neste sentido.

Na questão da trilha sonora, ela é uma “cama” para a ambientação. Não há uma música de fundo, e sim, o próprio som do ambiente e cenário em que você está, com exceção de certos momentos chave da trama – ou com inimigos próximos – que teremos aquela música tensa para colocar a cerejinha no bolo da adrenalina… ou do medo.

Gostaria de salientar o char design dos personagens, bem como a captura de seus movimentos e sincronização labial com a dublagem inglesa. Ainda com relação a design, também destaco o Castelo Dimitrescu e algumas regiões da Vila que compõe de forma homogênea o sentimento que o jogo quer passar, mesmo que você se sinta em uma época Medieval, depois nos anos 50, e depois na Revolução Industrial. Apesar disso tudo, a equipe de concept casou muito bem as estéticas apresentadas – mesmo que possa parecer caótico.

Resident Evil
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Facetas do Terror

Onde é que Resident Evil Village realmente brilha… em meio a escuridão? Nas escolhas da Direção. Como falei anteriormente, é notório de que a CAPCOM quis agradar todo mundo, e de fato conseguiu, mas como foi possível esta jogada?

A começar, com os diferentes “modos” de jogo e dos subgêneros do Horror. Trabalhando próximo a filmes e literaturas fantásticas, Resident Evil Village passeia por obras centenárias, flerta com diversas obras da cultura pop ocidental e dá aquela pitadinha do Gore Japonês, tornando um jogo único na franquia e excêntrico por abordar tantas referências. Além de toda concepção da Vila, e que escrevi anteriormente, os capítulos que seguem são calcados em homenagens – discretas, ou não – de clássicos do horror.

Por exemplo, Lady Dimitrescu:

  • Dentro da franquia ela é o que temos de mais próximo a um Tyrant, um pouco por sua estatura e também pela sua forma de perseguir, como um Mr X ou Nemesis. Não é das mais assustadoras, mas é extremamente carismática.
  • Fora dos games temos uma clara referência a Drácula, seja em sua forma de alimento (sangue) e também por suas filhas Bela, Cassandra e Daniela, que no caso da lenda romena, são as “esposas” vampíricas. Extra: na literatura, Drácula viaja em um navio chamado The Demeter.
  • Este primeiro momento do game me trouxe Bloodborne à tona muitas vezes, não só pelo clima vitoriano, como também pelo design de mapa do castelo. Uma mistura dos RE clássicos com pitadas Souls Like.
  • Além da Romênia, a Hungria também está presente por aqui. A dona Alcina é também muito inspirada na Condessa Bathory, uma nobre que também (pasme) se alimentava do sangue de suas vítimas para manter seu corpo rejuvenescido. Isso é o que contam né… 

Já nossa ventríloqua Dona Beneviento:

  • Aqui, a personagem mais misteriosa do jogo, já que não tenho a total certeza de seu destino e nem de como seus poderes realmente funcionam. Apesar de não confrontarmos diretamente com a Pessoa, temos a boneca Angie, o que me remeteu a filmes como Jogos Mortais 4 (o corpo sobre a mesa), O Brinquedo Assassino e seu boneco Chucki, Mestre dos Brinquedos e claro, Annabelle.
  • Apesar de termos referências explícitas com bonecos, sem querer dar muitos spoilers, O Chamado e O Iluminado também estão presentes de uma forma sublime, criando um dos momentos mais bacanas e aterrorizantes do jogo.

Pra fechar, temos Salvatore Moreau e Karl Heisenberg:

  • O corcunda (de Notre Dame) traz todo espetáculo da mutação, remetendo A Ilha do Dr. Moreau, A Mosca e até mesmo livros como A Metamorfose, de Kafka. Um personagem melancólico, que parece não querer estar por ali, senti muito por sua dor e é um dos meus personagens favoritos do jogo. Vale lembrar seu aspecto Kappa, youkai clássico do folclore japonês.
  • Heinsenberg é um personagem até que bem construído, e dos mais complexos, mas foi o que menos me apeguei por seu apelo “overpower”. Gostei da inclusão industrial em seu poder, mas não da forma Magneto de ser; gostaria de algo um pouco mais “pé no chão”. De qualquer forma, não só o personagem, mas como o seu próprio cenário, são inspirados em filmes de terror steampunk, Frankenstein e uma vibe Van Helsing.

Não esquecendo e não menos importante, Mãe Miranda. Como é lidar com um Mal que não se conhece?

Adoro a forma de como toda trama foi construída e dentro disso tudo, o desenvolvimento da Grande Vilã do game. Sem querer dar muitos spoilers, mas é interessante em como os desenvolvedores trabalharam a dicotomia Ciência x Sobrenatural, e muito daí se dá a partir do plot central do game – e que leva até a resposta do que (quem) é a tal Miranda.

Em sua criação e estética, sinto que cai um pouco das lendas nórdicas, da figura representativa do Corvo e da Morte. Enigmática, Miranda é o ponto chave para onde Resident Evil e toda a série deve caminhar – e caminhou. De fato, e depois de RE4, Resident Evil Village traz um capítulo importantíssimo para toda a saga.

Fábrica Heisenberg
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O que é Resident Evil?

Até antes do lançamento do jogo, muitos lançaram nas interwebs de que “o jogo não é mais o mesmo”, “perdeu a essência”, e fico me perguntando: qual a essência de Resident Evil?

Se você está nessa há uns 25 anos, ou pelo menos pegou o lançamento de RE4, já ouviu esta mesma história algumas vezes – e até mesmo com SpinOff. Mas o que faz Resident Evil ser diferente de outro jogo de “Zumbis”? Seria a franquia focada em “Zumbis”? Acho que está claro, e há muito tempo, que não.

Resident Evil chegou num patamar em que sua literatura se sustenta a seu bel prazer, independentemente do gênero que seguir e muito mais expansiva que um jogo de Polícia vs Zumbis. Apesar disso, não descarto, e ainda acredito que a CAPCOM deva voltar para esse lado mais nostálgico nos próximos anos… 

Com isso em mente, creio que a “essência” do jogo possa ser a abordagem BIOTERRORISMO (como o próprio nome original já diz), e não o Sobrenatural. Enquanto a série manter o cerne do mistério da “Origem” de tudo, ainda será Resident Evil, mantendo um equilíbrio nessa balança Sobrenatural x Ciência.

É fato que temos de ter uma suspenção de descrença tremenda, principalmente nos capítulos finais deste jogo, onde você pensa: “poxa, a ciência não faria isso”. Entretanto, ainda assim, acredito que os limites do absurdo não foram trespassados e mantém o motor Resident Evil nos trilhos.

Castelo Dimitrescu
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Para concluir

Resident Evil Village traz uma das melhores experiências da franquia, uma localização muito bem trabalhada – apesar de ser a primeira por aqui – e potencializa em específico, para melhor, os capítulos 4 e 7.

A dica de ouro: não procure informações sobre puzzles, tente por si a resolução, talvez pedindo ajuda pra um amigo ou outro. A sensação de estar perdido e desolado, faz parte da gameplay, é muito bom, assim como toda atmosfera do Horror, que por aqui, permeia por todos os níveis físicos da sensibilidade. Resident Evil Village é a polidez e firmamento do gênero nos dias atuais. O que será que vem a partir daqui?

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