“Aquele que luta com monstros deve acautelar-se para não tornar-se também um monstro. Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você.” – Friedrich Nietzsche, “Para Além do Bem e do Mal”

Calafrios perturbadores a todos!

Inspirado no Halloween e nos medos que a semana inspirada no Samhain (lê-se sowen) traz aos corações incautos (ou nem tão incautos assim), hoje eu vim falar um pouco de uma iniciativa brasileira em prol do fascinante mundo do Terror – e das preciosidades encontradas nos recônditos sombrios das mentes do escritores do tema no Brasil!

Fruto da paixão e da dedicação de Nathalia Sorgon Scotuzzi e Pedro Henrique Andrade, que partilham seu editorial na parte literária (ela) e na parte gráfica (ele), a Revista Diário Macabro é uma iniciativa renovadora da literatura nacional, buscando reviver a atmosfera dos pulp fictions das primeiras décadas do século XX, bem como revelar novos talentos da literatura de horror do Brasil.

O formato de revista – que recentemente lançou o terceiro número, num crescendo de conteúdo e qualidade! – foi escolhida para conjugar a facilidade de carregá-la no bolso, na bolsa, na mochila e na mão com a possibilidade de oferecer um material acessível e com qualidade gráfica para tornar a experiência possível a todo tipo de leitor. Numa formatação bonita, com uma logomarca cujo estilo reflete a qualidade do trabalho, a Diário Macabro foi estilizada com capas em tons escuros ou pastéis que evocam o medo, cujas ilustrações sempre refletem um dos contos do livro, e com capa traseira e contra-capas negras como a miséria humana. A formatação interna é também saborosamente sombria: tarjas negras nas bordas das páginas dão a sensação de uma “tela de cinema”, ajudando na imersão, e provocando um efeito de sombra que agrada a vista do leitor mesmo com a revista fechada.

O símbolo da marca “Diário Macabro”, a qual também dá nome à editora, é outro primor: um crânio com cabelos que dão a sensação de úmidos (ou seriam algas… ou quem sabe tentáculos?), que revelam tanto quanto ocultam, faz referência às criaturas monstruosas das profundezas infindáveis do oceano (numa alusão direta a um dos maiores autores da literatura de horror do século XX, H. P. Lovecraft). Suas presas afiadas, remetem não apenas a um dos mais clássicos mitos do horror, o famigerado vampiro, mas também à natureza bestial do ser humano que, manifesta, revela o verdadeiro monstro da vida real.

É impossível terminar de comentar o trabalho estético sem mencionar as excelentes escolhas dos artistas que brindam o leitor com suas artes. As ilustrações, tanto as das capas quanto do interior, são de qualidade excepcional. As escolhas das capas coloridas evocam sentimentos sombrios no leitor, e as ilustrações no começo e no final das revistas são deliciosamente perturbadoras. Dentre elas, destaco as de Pedro Caio Marfil (DM nº1), André Martucelli (DM nº2), e ambas as de David Alan (DM nº3), com traço impressionante e tom assustador, de verdade. (Mas devo dizer: a criatura do Dan Ramos no terceiro número me dá arrepios só de lembrar… *arrepios*) Além das ilustrações, as tirinhas sensacionais merecem menção à parte… mas eu vou deixar você curioso pra ver. *devilface*

Além da escolha cuidadosa pelos contos, cada número vem contando também com um pequeno “brinde” (não só no sentido de “prêmio”, mas também no de “celebração”) na forma da tradução de um conto por um escritor internacional das pulp fictions do século passado, como uma homenagem e uma forma de saciar (e provocar) o desejo do crescente público de horror brasileiro, sedento por sangue conhecer a literatura clássica, mas sem acesso à língua de Shakespeare.

Ora, ora… Minha mente poderosa, abençoada pelos Grandes Antigos, revela que você, que é uma criaturinha das trevas danada de esperta, a esta altura já se cansou de ouvir o que eu acho e quer mesmo é um sneak peek (“Você quis dizer: espiadela?”, by Google) das obras, estou certo? É claro que estou! 😉 Então vamos lá… e não se preocupe, nada de spoilers! – ou você acha que eu o privaria dos medos que o assombrarão após uma incauta leitura destes textos macabros?
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Diário Macabro, vol. 1

Diário Macabro nº 1 (80 p., 1ª edição: maio/2017; 2ª edição: Março/2018)

O primeiro número faz um apanhado de estilos muito diversos, com contos assustadores de natureza diversa. Apresenta, entre as diversas revelações, um conto da própria editora Nathalia Scotuzzi, e com as ilustrações temáticas de cada um dos contos pelo editor Pedro Andrade. Sendo este o número de estréia, que norteou o trabalho desenvolvido, já conta com uma segunda edição, com revisão aprofundada e qualidade gráfica aperfeiçoada. Este número tem um diferencial: contou com um conto em língua inglesa! Destaque para os contos “Dionísio”, com uma perspectiva perturbadora sobre o que os conflitos de um homem que vive um dilema, e “Família”, sobre horrores reais.

O primeiro número da obra tem temática diversa:

  • Carne Fresca – um jovem se vê obrigado a um trabalho que jamais irá esquecer.
  • Cenotáfio – ver o mundo de cima nem sempre é bom…
  • Dionísio – os conflitos de um homem dividido entre duas paixões selam seu destino.
  • Amor – perder um amor nos leva a medidas desesperadas…
  • Família – sobre como sonhos doces se tornam amargas realidades…
  • Os tempos estão mudando – o mundo lá fora pode ser muito, muito pior.
  • The man with no reflection (“O homem sem reflexo”, em tradução livre) – um conto sobre realidades que não se vê.
  • Tradução: Robert E. Howard – O temido toque da morte – o medo nos mantém vivos… ou será que não?
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Diário Macabro, vol. 2

Diário Macabro nº 2 (144 p., Novembro/2017)

O segundo número quase duplicou de tamanho, embora ainda com oito contos. Neste número, uma agradável surpresa: uma entrevista com o mestre Rubens Lucchetti, escritor veterano das pulp novels que ainda escreve aos 87 anos e que, dentre os mais de 1500 livros e 300 HQs, já foi também roteirista para obras como as de outro mestre, Zé do Caixão. A tirinha final deste número me fez sentir medo de alguns autores dos contos da Revista Diário Macabro… e culpado por escrever eu mesmo alguns contos de terror (pois é, sou um amante amador da arte)… É difícil destacar algum conto, vários mereceriam a posição. Eu pessoalmente destaco “Aqui todo mundo é feliz” (de arrepiar! Um dos contos que mais mexeu com este que vos fala!) e “Visualizado” (te prende do começo ao fim, e fez jus à ilustração da capa deste número).

Os contos são:

  • Um caso documentado de possessão eletrodoméstica – título eloquente, com final surpreendente!
  • Aqui todo mundo é feliz – as coisas que vivem no escuro…
  • A bizarra entrevista com Nivaldo Fonseca – um cantor de sucesso abandona tudo por mera excentricidade… ou será que não foi só isso?
  • A noite dos seres negros – um arrepiante contos sobre os mistérios de um lugarejo no interior do Brasil.
  • Coceira – comer e coçar, é só começar…
  • A filha do professor Carletti – as pessoas mudam… e nós também.
  • A coisa no fim do beco – o drama de uma paciente mexe com um psiquiatra, e revela coisas perturbadoras.
  • Visualizado – Uma festa adolescente dá muito, MUITO errado.
  • Tradução: H. Beaugrand – Chasse-galerie: o pacto – um conto sobre uma lenda sombria do Norte do Canadá
Diário Macabro, vol. 3

Diário Macabro nº 3 (144 p., Agosto/2018)

Aaahhh, você pensou que eu revelaria os mistérios recentes como as cartas revelam maus presságios? Pensou errado otário! Ora meu caro comensal das sombras, eu jamais faria isso! Mas vou lhe revelar o suficiente apenas para enfraquecer as já débeis barreiras entre seu consciente e a loucura que habita os recônditos sombrios de sua mente…

O terceiro número é fresquinho! Recentemente lançado, chegou há alguns dias às mãos dos leitores! Com o mesmo número de páginas do anterior, este número conta com não oito, mas treze contos incríveis, sendo um deles uma tradução do britânico M. P. Shiel (O Macaco Pálido), e dentre os originais figuram títulos como O grito da bruxa e A coisa que se arrasta na escuridão. Assustador, não? Sim! Imperdível, não é? Com certeza! E para fechar o número uma entrevista com um dos escritores best-sellers brasileiros da atualidade, um entusiasta da arte de contar histórias que tem crescido em respeito e liderado um esforço de renovação da literatura nacional, além de reconhecido escritor de horror e literatura fantástica: André Vianco.

Horror, arte, mestres antigos e atuais, pessoas apaixonadas pelo que fazem e o seu gênero de literatura favorito, tudo temperado com o prazer de estimular a literatura nacional com o apoio de um trabalho de qualidade. O que mais você está esperando? Acesse o SITE OFICIAL e conheça esse belíssimo trabalho nacional, inspirado nos cenários, histórias e mistérios brasileiros!

Ah, e se você tiver um tempo e disponibilidade entre 12 e 14 de Novembro, o  IV Congresso Internacional Vertentes do Insólito Ficcional, congresso dedicado inteiramente ao horror/gótico/insólito/fantástico, focado em monstruosidades ficcionais, estará acontecendo na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), na cidade do Rio. Diversas palestras, comunicações e muitos estudos dedicados ao horror, tudo aberto ao público, estarão disponíveis para você. Participe!

Sonhos sombrios,

JD Vollet Filho