Nessa edição da Bienal do Livro do Rio de Janeiro, a homenagem ao Japão é feita em grande estilo. Temos um lindo espaço realizado pelo Consulado do Japão bem na entrada do evento? Temos. Temos uma grande best-seller de literatura thriller como a Kanae Minato entre nós? Temos. Isso é tudo? Mas nem de longe!
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Uma homenagem que traz ao seu evento o filho do maior nome dos mangás de todos os tempos é sem dúvida uma homenagem que honra ao pé da letra o seu homenageado. Visitando o Rio de Janeiro pela primeira vez, o diretor de cinema e animação Makoto Tezuka chega à Bienal para participar de um painel com nosso querido Maurício de Souza, um grande amigo de Osamu Tezuka.
Makoto Tezuka teve a enorme gentileza de dar alguns minutos de seu tempo para conversar conosco, mesmo cansado de um longo trânsito congestionado em meio à forte chuva.
Makoto Tezuka, com certeza você já está acostumado a ser associado com seu pai, mas como foi conciliar o peso de ser filho de um grande nome com o seu desenvolvimento pessoal como indivíduo e profissional de cinema?
Antes mesmo de eu sentir a necessidade de pensar nesse tipo de coisa, eu já gostava muito de cinema. Quando eu tinha 16 anos, fiz um filme com alguns amigos e felizmente fomos premiados num concurso para alunos do ensino médio. Isso foi uma porta para que eu pudesse começar a conhecer profissionais da área e poder trabalhar com cinema. Continuei produzindo filmes depois de entrar na universidade e minhas produções tiveram um bom sucesso.
E isso te ajudou a trilhar um caminho próprio e evitar um complexo de viver à sombra do nome de Osamu Tezuka, imagino.
Sim, com certeza. Quando participei no primeiro concurso, um dos juízes que nos selecionaram foi o lendário diretor Nagisa Oshima. Quando fui agradecê-lo eu disse que meu pai com certeza também ficaria bastante feliz e ele me perguntou: “Mas quem é seu pai?” *risos*. Então ele nem sabia que meu pai era o Osamu Tezuka, o que ajudou muito a construir minha autoconfiança.
Quando falamos de cinema e Japão, o nome de Akira Kurosawa é inevitável. Qual foi o tamanho da influência dele pra você?
Sem dúvida, Akira Kurosawa é um dos nomes mais respeitados do Japão e com certeza todos que o sucederam foram influenciados por ele de uma forma ou de outra. Só que quando eu comecei no cinema, nos anos 80, o Kurosawa já não fazia mais tanto sucesso e as empresas cinematográficas já não pediam mais tantos trabalhos dele. Acredito que minha geração foi a primeira geração de cineastas que passaram a trilhar caminhos mais independentes, mais distanciados da influência do Kurosawa.
E depois que eu comecei a trabalhar no ramo, a Kurosawa Production entrou em contato comigo dizendo que o Kurosawa ia trabalhar numa nova produção, mas que ele já estava muito idoso, então eles queriam um documentário sobre essa produção. Depois em um comentário, a empresa disse que por trabalharmos um pouco de fora dessa esfera de influência, pudemos fazer um documentário mais objetivo do Kurosawa. Então fiquei três meses acompanhando de perto as produções desse filme para o documentário.
Você dirigiu algumas temporadas de Blackjack, um anime sobre as aventuras de um médico extraordinário. O fato de sua família ser bem ligada com a medicina desde o seu avô te deu alguma intimidade pessoal com a obra? Foi isso que te motivou a esse trabalho?
Mais ou menos. Com certeza a minha família toda sempre esteve próximo da medicina, até bem antes do meu avô. Não foi bem o caminho que eu quis seguir. Minha maior intenção era na verdade trabalhar em um live action de Black Jack, só que a iniciativa não avançou tão bem. Então a produtora resolveu sugerir que transformássemos aquela ideia em um anime e foi o que fizemos.
A Turma da Mônica foi o primeiro contato com as letras e o primeiro meio de alfabetização de muita gente, incluindo eu mesmo. Como você avalia a obra e a pessoa de Maurício de Souza, considerando a longa amizade dele com seu pai?
Infelizmente a obra do Maurício ainda não é muito conhecida no Japão, mas meu pai falava muito do trabalho maravilhoso que ele fazia, ele realmente falava muito do Maurício de Souza pra mim e era de ouvir falar que eu o conhecia. Depois que meu pai faleceu é que eu fui encontrá-lo e conhecê-lo pessoalmente. Esses encontros foram se repetindo e foi aí que eu pude ver de perto essa pessoa maravilhosa que ele é.
Meu pai e o Maurício tinham prometido realizar um trabalho em conjunto usando os seus personagens, o que infelizmente não foi possível em vida. Quando meu pai faleceu, foi o Maurício quem entrou em contato comigo dizendo se não havia alguma forma de nós fazermos um trabalho de colaboração dos personagens da Turma da Mônica e com os personagens das obras do Osamu Tezuka. Fui fazer essa ponte e foi uma felicidade enorme poder coordenar todo o trabalho e cumprir a promessa que meu pai havia feito anos atrás.
Makoto Tezuka estará compartilhando um painel com Maurício de Souza na quarta-feira, dia 04 de setembro às 15h no Auditório Madureira (Pavilhão Verde). A cobertura desse painel e de outros você também confere aqui no SUCO!