Um garoto que assombrado por um amor antigo tenta controlar e acabar com essa maldição. Esse é o plot central do filme Jujutsu Kaisen 0, prequel da primeira temporada de Jujutsu Kaisen. Lançado em dezembro de 2021 no Japão e animado pelo aclamado MAPPA, o longa de 1h45 é a expectativa do momento para os fãs brasileiros. Inclusive, expectativa que aumenta a cada dia, principalmente depois do adiamento da estreia do anime no Brasil, que agora está marcada para o dia 28 de abril.
Bom, como todo anime de sucesso, Jujutsu Kaisen 0 causou um alvoroço no fandom, tanto pelo trailer incrível quanto pela qualidade já conhecida da série. De qualquer forma, acabei de ler um comentário que vem muito a calhar como introdução pra esse review. Ele dizia: “A julgar pelo anime com certeza deve ter sido um ótimo filme só acho estranho que não estou vendo ninguém falar muito”. É… pois é. Depois de ter visto o filme, vejo que tem motivo pra ninguém estar falando muito, bem diferente da febre que foi Demon Slayer Mugen Train, por exemplo.
Sendo esse um filme tão esperado e que carrega tamanha expectativa apenas pelo peso da obra, será que ele conseguiu bater as expectativas? Bom… Ele tentou. Nesse review irei abordar os pontos que me chamaram atenção, positiva e negativamente, então vamos lá.
AVISO: ESSE REVIEW CONTÉM SPOILERS! AO CONTINUAR LENDO VOCÊ ESTÁ POR SUA CONTA E RISCO!
Enredo
Primeiro de tudo, vamos começar com o enredo da obra. Resumidamente, somos apresentados a Yuta Okkotsu, um garoto reprimido e vítima de bullying pelos colegas de escola. Ele foi notado por Gojo Satoru após ferir gravemente os seus agressores com a maldição de nível especial que carrega consigo. Não demora muito para a trama nos explicar que essa maldição na verdade é Rika Orimoto, uma amiga antiga de Yuta que morreu num acidente brutal diante do garoto. Ainda em vida, Rika presenteou Yuta com um anel de compromisso, e ambos prometeram que iriam se casar no futuro. No entanto, a junção dessa promessa com a brutalidade com que a garota foi morta fazem surgir essa terrível maldição, que protege o Yuta mesmo contra sua vontade.
Então, após Gojo ter salvado Yuta da execução (mais ou menos como foi com o Yuji mesmo), o garoto ingressa na Escola Jujutsu para aprender a controlar a maldição e usá-la para o bem. A partir daí a história se desenvolve, mostrando treinamentos, missões, a interação dele com os outros, enfim, nada muito novo, mas ainda assim ótimo de assistir. Com o passar do enredo descobrimos que Geto Suguru está atrás da maldição de Yuta, pois com ela se tornaria invencível, aquela coisa toda de vilão. Assim, Geto faz diversos ataques até finalmente ir para a Escola Jujutsu, onde luta contra Yuta e o filme acaba.
Bom, o filme é bem fiel ao mangá de Jujutsu Kaisen 0, talvez um pouco menos gore no início, mas com pouquíssimas mudanças. Fora isso, o enredo não traz nada de muito novo, se aprofunda aqui e ali, mas no geral mostra tudo o que já vimos em algum anime shounen, o que não é algo negativo, necessariamente. Dito isso, vamos analisar alguns pontos mais detalhadamente.
Personagens
Primeiramente irei falar do destaque recebido por alguns personagens já queridos pelo público: Gojo, Maki, Toge e Geto. Em relação à Maki e ao Toge, foi muito satisfatório ver o tempo de tela que eles receberam, ficando algumas vezes no destaque das cenas. Vimos a força e habilidade de Maki, além do poder e gentileza de Toge. No meio disso, infelizmente o Panda ficou um pouco de fora, mas ainda assim teve seus momentos importantes. Ainda assim o trio se destacou, em especial Maki, que teve espaço pra mostrar mais da relação com sua família e consigo mesma.
Agora, foi ótimo ver a relação de Gojo e Geto um pouco mais aprofundada. Numa pegada meio Naruto e Sasuke, conseguimos pegar pistas da história dos dois. Assim, nas palavras do próprio Gojo, Geto é seu único e melhor amigo, então é emocionante ver a relação conturbada e saudosa dos dois. Além disso, somos presenteados com breves flashbacks da juventude deles, nos levando a questionar o que aconteceu de errado no meio do caminho. Bom, esperamos que sejam cenas para a próxima temporada.
Em contrapartida, seja pelo afeto com os personagens que já conhecemos, ou seja por uma falha na construção de personagem, Yuta, o protagonista, acabou meio apagado. A personalidade dele é fraca e mole, ele não parece ter ambições ou motivações muito sólidas e, na minha opinião, a evolução dele foi extremamente forçada. Com isso, seguirei para o próximo tópico.
Um Protagonista bem Insosso
Primeiro de tudo, o que se espera de um protagonista? Que ele tenha uma personalidade marcante, tenha uma forte motivação, força de vontade e mudança visível ao longo da história. Pois é, Yuta não preencheu nenhum desses requisitos. Ele até tentou, mas passou longe de ser um personagem bem construído. Até mesmo a Maki dá uma prensa nele, perguntando qual seu propósito, o objetivo, por que ele luta, enfim. Essa cena, na verdade, serviu apenas pro Yuta liberar a maldição da Rika completamente, mas até mesmo nisso o filme conseguiu ser meio desconexo.
Enfim, Yuta não evolui ao longo da narrativa, a única “evolução” que ele tem é uma coisa forçada no final, apenas por ser o protagonista e pra dar o “viveram felizes para sempre” que os fãs esperam. Em seus treinamentos com a Maki, em nenhum momento ele teve um avanço significativo. Ok, ficou mais rápido, mas não conseguiu uma vez sequer surpreender ou desarmar a garota. Já vimos tantos animes em que os protagonistas passam um perrengue pra ficarem fortes, Tanjiro, Naruto, Deku, Luffy e tantos outros. Assim, um personagem que treina meia dúzia de vezes, não consegue nem encostar um dedo no seu treinador e ainda assim chega na batalha como se tivesse uma vida inteira de experiência em combate é quase insultante.
Além disso, a força de vontade e a motivação de Yuta são tão grandes que cabem numa tampa de garrafa. Eu faço a mesma pergunta que a Maki, qual é o seu objetivo, o que você quer Yuta??? Pois aparentemente, ele quer exorcizar a maldição porque o mandaram, do contrário tentaria morrer mais uma vez. Ok, ele não quer mais machucar as pessoas, mas e aí? E depois? O que ele quer fazer com isso? Não é como se ele tivesse um grande objetivo a ser alcançado, parece que ele simplesmente foi sendo levado pelo fluxo da vida. O que, pra um protagonista, é péssimo.
Juntamente com isso, não sabemos muito mais sobre a vida dele. Não sabemos nada sobre os pais, da onde ele veio, da sua família, nada. Com isso, trago mais um ponto que me fez perguntar “sério isso?”. Já nos últimos minutos de filme, quando toda a pancadaria já tinha terminado, Gojo chega no Yuta e fala “pois é, na verdade foi você que amaldiçoou a Rika porque na verdade é descendente de Sugawara no Michizane” e pronto, tudo foi solucionado. Sinceramente, essa resolução mágica e milagrosa que acontece em várias obras é decepcionante. Em nenhum momento da trama foi sequer suposto que Yuta poderia ser descendente de alguém importante, essa informação foi trazida apenas pra dar uma explicação rápida e “”plausível””. Honestamente, esperava mais.
Furos de Roteiro
Continuando com os aspectos da história que eu achei mal construído, vamos começar, obviamente, do começo. Então, Rika é uma maldição que protege Yuta de aparentemente qualquer perigo, até mesmo de um bando de adolescentes malvados. Aparece também quando três Feiticeiros Jujutsu iniciantes apenas ameaçam o garoto, ok. No entanto, quando uma maldição de verdade, do tamanho de um prédio, literalmente engole o Yuta, Rika não dá nem sinal de vida. Afinal, faz todo sentido proteger ele contra vários jovens humanos, mas contra uma maldição gigante que pode matá-lo, meh, não é necessário.
No entanto, é claro que isso tem um motivo. É nessa hora que Mika dá aquele sacode no Yuta e aí então ele decide fazer alguma coisa que não seja choramingar. Assim, Yuta, que nunca havia conseguido controlar Rika antes, como mágica, coloca o anel que ganhou de presente da garota e a invoca para salvar o dia. Ainda, a maldição não fica descontrolada, mesmo sendo a primeira vez que é liberada completamente. Impressionante.
Não o bastante, isso acontece novamente no final do filme, e pasmem! Rika inclusive ajuda a curar Maki, Toge e Panda, que foram espancados por Geto. Logo em seguida Yuta luta contra Geto, conseguindo até mesmo usar a técnica da Voz Amaldiçoada com um megafone criado a partir de Rika.
Então vamos lá, Yuta treinou apenas alguns meses na Escola Jujutsu, nunca conseguiu tocar uma unha na Maki, não aperfeiçoou sua técnica com a espada (ou pelo menos não foi mostrado), nunca havia conseguido controlar ou sequer entender a maldição de nível especial que carrega, MAS conseguiu solucionar tudo como um verdadeiro profissional nessa última batalha. E não somente isso!! Ele ainda lutou e venceu Geto, um Feiticeiro Jujutsu que daria trabalho até mesmo pro Gojo.
Além disso, nessa luta Geto invoca uma maldição nível especial, um espírito vingativo E ENTÃO…. nada, a maldição não faz nada. Eu sequer consigo escrever isso sem dar risada, de tão ridículo que é. Um dos personagens mais poderosos invoca uma super maldição poderosa que não faz NADA porque um garoto milagrosamente aprendeu a lutar e derrotou ele. Sério, não dá.
Fora isso, e o beijo, o que foi aquele beijo na maldição?! Yuta passou o filme inteiro reclamando da Rika, pedindo pra ela se acalmar, assustado, mas aí no último segundo dá um beijo na maldição. Um beijo… Eu não consigo nem falar muito sobre isso.
Inclusive, a relação de Yuta e Rika quando a garota ainda estava viva foi abordada muito superficialmente. Mostraram pouquíssimas cenas dos dois juntos, e apenas repetiram elas o filme inteiro. Ou seja, o espectador é meio que obrigado a acreditar que eles tinham uma ligação profunda e especial, uma relação realmente forte, porque a forma que isso é mostrado é tão fraca quanto a personalidade de Yuta. Mais um ponto decepcionante.
Considerações Finais
Em suma, não é o melhor dos filmes, não tem o melhor dos enredos e nem o melhor dos personagens. Depois de ver o filme li o mangá de Jujutsu Kaisen 0, porque pensei que eles tinham cortado alguma parte ou resumido alguma coisa. Não, o anime é bem fiel à obra original, o que torna a situação ainda mais frustrante, se considerar a primeira temporada de Jujutsu, muito melhor estruturada. Então, depois de refletir um pouco, não acho que a proposta de Jujutsu Kaisen 0 seja ruim, pelo contrário, tem potencial pra ser uma história tão fascinante quanto a principal.
No entanto, acho que eles não deveriam ter feito uma história com tanto conteúdo ser resumida num filme de 1h45 ou num mangá de quatro capítulos. Acredito que a maior parte das críticas levantadas aqui seriam resolvidas caso a trama tivesse tempo e espaço para se desenvolver. Mostrar mais do treinamento do Yuta, da relação dele com a Rika, do processo de evolução dele como Feiticeiro Jujutsu. Contudo, o resultado foi um enredo corrido, com cara de que tem partes faltando, obrigando o espectador a acreditar que as relações, a força e a evolução do protagonista são verossímeis.
Peço que não me levem a mal. Sou fã de Jujutsu, fissurada na história principal e fico doida pra ver a segunda temporada. De qualquer forma, mesmo sendo fã da obra, consigo reconhecer que Jujutsu Kaisen 0 não é um filme/mangá muito bom, e tudo bem. Gege Akutami continua sendo um excelente mangaká e não tiro seu mérito, mas creio que com essa história ele não acertou.
Por fim, digo que se você é fã da obra vale a pena assistir, de qualquer forma. Caso foque nas partes de luta e ignorar tudo o que dá estrutura pra uma história, vai gostar do filme. Ponderei muito a nota que daria pra Jujutsu Kaisen 0 e admito, se não fosse Jujutsu Kaisen, teria dado um 2,5 sem pestanejar.
Então sugiro que você vá ao cinema mais próximo, assista ao filme e tire suas próprias conclusões! Depois vem aqui contar pra gente o que você achou!