Em forma de homenagem ao Halloween, este é o primeiro post de uma sequência de quatro Lendas Japonesas, não necessariamente de Horror, mas dentro do folclore nipônico. Issun Boshi, também conhecido como “polegarzinho” aqui no ocidente, é a nossa primeira escolha.

Nossa ilustradora e master-chef Sofis se encarregou de fazer esta bela arte (veja mais abaixo), como parte mais lúdica desta apresentação que lhes farei. Já adianto que não esta, como todas as lendas, possuem diversas versões e a de Issun Boshi: A Lenda do Pequeno Valente pode conter variações na forma de como a aventura é narrada; entretanto, quase sempre o sentido é o mesmo. Vamos conhecer sua história?

Cresça! Cresça! Cresça!

Há muito tempo atrás, no Japão, vivia um casal de idosos. Sozinhos, ansiavam por um filho, já que achavam que a maior felicidade era ter um. Eis que seguiram até um santuário e oraram. Oraram para terem um filho, um filho pequenino; um filho para dar amor, abraço e carinho.
Ora! Não deu muito tempo e nasceu o bendito. Era pequenino e tinha o tamanho de um polegar – você olhou para o seu? Pensa só, em ter uma pessoa deste tamanho?
É claro que isso não foi um infortúnio. O casal criou a criança como outra qualquer; deu-lhe educação, uma vida digna e zaz! E olha que, mesmo cheio de mimos, ele quis se aventurar – e na cidade GRANDE. “Quem sabe tentar a sorte por lá”, pensou. Logo, ele pegou sua espada, que para nós era uma agulha, e seguiu viagem em um barco – uma tigela de arroz…
A cidade era grande. As pessoas também. Era necessário desviar aqui e acolá para que ninguém pisasse. Mas isso não era problema, e não o afetou, pois seguiu firme e com muita destreza em seu objetivo de ter um emprego. E não é que arranjou?
Arrumou em uma Mansão na cidade – algo que para os dias de hoje seria um Menor Aprendiz. Prometeu lealdade e assim passou a angariar carisma entre os habitantes. Ganhou amigos e bem, também uma paixão. Mas esse não é o papo de agora, pois foi com surpresa que um Oni (ou demônio), vil e horripilante, saltou de repente e não teve jeito: o pequenino desembainhou sua espada e mostrou sua coragem!
Lutou bravamente até ser engolido por sua enorme boca, mas Issun Boshi era esperto e começou a espetar o estômago da criatura causando-lhe muitos ferimentos. Abalado, cuspiu fora o jovem, que em um passo de agilidade subiu em seu tronco pelos ombros e furou seus olhos. Era danado esse menino, não é mesmo?
O monstro saiu correndo de medo e deixou cair seu martelo mágico. Ora, e não é que seu amor, ainda platônico, disse que o poder daquele artefato era realizar um desejo, como ter comida eterna ou dinheiro infinito – assim como em um conto de fadas?
Sem pestanejar, Issun Boshi falou: “Não quero ser rico e nem ter comida em abundância. Eu quero é ser de tamanho normal”. A jovem sacudiu o martelo dizendo “Cresça! Cresça! Cresça!” e zaz! E não é que ele cresceu mesmo?
O final da história é aquele clássico. Seu amor se tornou físico e real. Casou com a jovem e prometeu protegê-la até o fim dos dias. Já seus pais? Saindo um pouco daquele ditado “o bom filho a casa torna”, na verdade, Issun Boshi os levou para a capital. Fim.
Issun_Boshi
Issun Boshi, por @capivara.criativa

Divagando

É notório a similaridade do conto de Issun Boshi com o de A Polegarzinha (Hans Christian Andersen) ou As Viagens de Gulliver (Jonathan Swift), mas não é essa correlação que gostaria de fazer por aqui. O que me vem a tona ao ler esta lenda japonesa é o conceito de Família Tradicional, desde a “obrigação” do casal em ter filhos – e acreditar que isto lhe trará uma felicidade inexorável – como da crença do Filho ter de ir para a Cidade Grande.

Na sequência temos a “saída de casa”. No Brasil, pelo menos até meados dos anos 90, após seu êxodo rural, aconteceu muito dessa crença do filho estudar fora, construir sua carreira e casar, e é curioso – incrível também – como isto também está presente do outro lado do globo, mesmo que centenas de anos atrás.

Já do lado otaku, o episódio em que Goku e Vegeta entram na barriga do Majin Boo e encontram até uma sociedade por lá, traz uma referência clara de Viagem ao Centro da Terra (Júlio Verne) e quem sabe, Toriyama também tenha dado sua referência com Issun Boshi. Isto foi algo que me veio em lembranças ao ler este conto japonês.

E com você, quais sensações ou experiências vividas Issun Boshi lhe despertou em sua mente? Você considera uma trajetória de superação ou apenas foi uma “recompensa” por seus atos? E se na verdade ele nasceu em meio a uma sociedade de Gigantes e que na verdade, ele tinha o tamanho de um Humano “normal”?


*A lenda de Issun Boshi pode ser encontrada em diversos blogs na internet e também em livros de mitologia japonesa. Como um desafio lúdico e mental, resolvi escrever da forma que me lembrava, deixando assim uma experiência de Contação, ou seja, algo mais próximo do boca-a-boca e de como uma história antiga era levada adiante pelos povos.