Existe uma ilusão que muitos amantes do esporte vivem, principalmente nós brasileiros, a ideia que a vinda de um jogador ou um novo técnico para um time já é argumento de grandes mudanças e que muito títulos virão na temporada, até esse time perder dez ou onze jogos e nada mais prestar, muda tudo porque não deu certo. Esse imediatismo é o que mancha todo trabalho que poderia funcionar no futuro. Imagina em Ahiru no Sora, onde não existe jogadores, um objetivo ou sequer vontade o suficiente para montar um time, e quando se aparece uma luz, é ofuscada por uma grande fumaça de problemas, e mesmo assim foi ignorado só porque as partidas não soltam laser dos olhos como efeitos de velocidade, uma pena para todos esses otakus, pois perdem o segundo maior anime de basquete de todos os tempos.
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O primeiro ponto a se destacar têm que ser a briga virtual entre o autor Takeshi Hinata e os estúdio Diomedea, envolvendo a animação que apelou para um visual ao estilo Kuroko no Basket, ao qual “ofendeu” o autor e com razão; a linguagem de Ahiru no Sora é diferente de uma forma gritante, não é cheio de ação ou um atropelo de trama, aliás é totalmente o contrário. Argumento esse que vale o questionamento, o jeito de como a trama do anime caminha, junto com seus elementos que constroem cada personagem, do mais ao menos importante, não faz dele uma obra mais direcionada para o público seinen do que shounen?
Um anime adaptado de um mangá seinen, como o próprio termo diz, é direcionado para o público adulto, não necessariamente precisa ter sexo ou violência, mas a linguagem dele ser muito arrastada, junto com o desenvolvimento de personagem e plots de fortes emoções que não relacionada a ação não me pareceu algo tão shounen assim, e como todos sabem, o “jovem” não gosta de coisas demoradas ou arrastadas, é oito ou oitenta. Isso é apenas uma opinião baseada no “achismo”, mas esse anime pode ter sido vendido errado, e mais, muitos preferem defender esses elementos na trama quando se trata do gênero isekai.
A desistência de alguns otakus pra esse anime é plausível, como dito antes, esse anime é tão cirurgicamente amarrado e trabalhado em cada ponto que dificilmente a trama não vai ser aquele caminhar lento de uma tartaruga. Em um momento, este aspecto chega a ser exagerado, mas justificável, no momento em que uma das partidas de basquete duram cerca de dez episódios, regado de flashbacks, plot twists, lances e jogadas do basquete, além da construção de literalmente os cinco jogadores de cada time e alguns reservas, argumento suficiente para entender o porquê muitos desistiram da animação.
Junto com Slam Dunk e talvez superando Haikyuu, o modo como Ahiru no Sora apresenta o que significa um trabalho árduo de alguém que segue um sonho, mesmo ele sendo impossível é algo que já é maravilhoso, e a cada fracasso, sempre vai ter um ser humano a mais na sua vida para te questionar: sério que você ainda acredita nisso? Pra que tentar tanto? Aceita, isso não vai dar certo, é burrice! E sempre alguém do seu lado, seja amigo ou família, que vai te jogar para baixo, te deixando aquela dúvida: Será que realmente estou sendo teimoso com algo que já está fadado ao fracasso? Um pensamento que poucos absorveram em Ahiru no Sora, por causa do grande centro do anime, o time Kuzu, todos eles.
O protagonista Sora chega em uma escola e entra para o time de basquete, time esse que não passa de um bando de moleque que senta no fundão da sala e só quer briga com outras escolas, tudo para dar errado, o que não é imaginado é a dimensão do quanto problemático foi esse bando de delinquente tentar jogar basquete e achar que vão chegar em algum lugar, mesmo com suas ambições construídas e defeitos, seja ele habilidade ou algo mais pessoal apresentados, nada parece servir de combustível para superar as próprias expectativas. Cada momento do anime, um novo fundo é cavado para esse poço e ali se vê o que é a morte da esperança, que para muitos é justificável para fazer com que alguém seja amargurado para o resto da vida por sonhos mortos, em Ahiru no Sora há essa divisão, e te traz a incerteza daquilo que muito pensaram quando chegaram no limite e fracassaram, e agora? Só que para todo problema há uma solução, seja ela grandiosa ou minúscula, independente se você acredita ou não, esperança e sonhos é o que fazem muitos continuar, essa esperança está no protagonista Kurumatani Sora. Você termina de assistir os cinquenta episódios e a única coisa que você quer fazer é abraça-lo e dizer que ele merece o mundo.
A caracterização para cada personagem é algo que desconstrói todo anime de esporte moderno, os conflitos gerados pelo passado moldaram cada um deles para que chegassem ao final dessa temporada de uma maneira bem extrema, confiança na base do fracasso conjunto, alguns com a cabeça avoada quanto a trabalho de equipe e achar que resolveriam tudo sozinho. Entretanto, outros entendem o basquete na prática, reconhecendo a própria limitação e até errando de forma grotesca no meio da partida, o início te joga no pessimismo de um bando de garotos que se intitulam “time”, e no fim chegam com novos problemas e limitações, mas que mentalmente se mostram um grupo mais maduro, ainda engatinhando como um time, foi preciso cada porrada na boca do estômago e catástrofes para que nós terminássemos o último episódio com uma única frase: “Eu acredito!”
Julgar aqueles que desistiram é errado, realmente não é um anime tão fácil, chamá-lo de ruim é ignorância, trama arrastada não é sinônimo de inferioridade. Ahiru no Sora dividiu o público por não ser um Kuroko no Basket, mas acertou em cheio no nível Slam Dunk de profundidade. Vale a experiência!