Falemos hoje de Cossette! Uma minissérie de três episódios de 2004 lançada pela conhecidíssima Aniplex. O anime de suspense tem a duração de um filme e rende um ótimo entretenimento para um final de tarde. Venha saber mais neste Review!
UM SUSPENSE GÓTICO
“Cossette no Shouzou” presta homenagem àqueles que curtem uma estética barroca: o cenário é ambientado na maior parte do tempo em uma loja de antiguidades; além disso, em uma taça de vidro veneziana reside as memórias de uma garota há muito falecida, Cossette. E o que mais grita “gótica lolita” do que uma menina nascida há 250 anos vestida com roupas francesas de época?
(Você nem precisa raciocinar até esse ponto aliás, o próprio anime já deixa um “GOTHIC LOLITA” enorme, pichado em um muro, mastigadíssimo para nós)
Cossette é o objeto do mistério que gira em torno do anime. Seu alvo, acidentalmente ou não, é o jovem Eiri Kurahashi, um jovem estudante de belas artes e responsável pelos artigos da loja de antiguidades. Seus amigos passam a perceber um comportamento estranho, atípico de quem ele costumara ser até então. Distraído e avoado, não tarda até que um dos rapazes à mesa lance a resposta de todas as perguntas: “É uma mulher! Ele tá apaixonado!”. Certo esse amigo está, mas não pelas razões que imagina.

CRISE DE IDENTIDADE
Assim como o Louco da música de João Gilberto, a taça de vidro veneziano virou o mundo de Kurahashi. Com ela em mãos, o rapaz sentia a vida desta que o fazia sentir-se pela primeira vez de coração alterado. E como todos os recém apaixonados, ele só quer mais dessa presença. O que também é verdadeiro para os recém apaixonados, (e que pega mal mencionar) é o fato de que essa ânsia eventualmente vira a própria ruína.

Pois a raiz do mistério na qual repousa a obra, e onde toma a trama gira em torno, é esta: Cossette ainda paira no mundo pela força do rancor que mora tanto em sua alma quanto nos objetos de sua antiga residência. Sua família e sua vida foram tiradas pelas mãos da pessoa amada, o pintor italiano Marcello Orlando. Artista e musa se apaixonaram, mas a obsessão de Marcello com a beleza de Cossette não o permitiu aceitar a própria ideia de mudança; de que Cossette eventualmente iria crescer e tornar-se diferente.
Então, num acesso de loucura, Marcello mata seus patronos e por fim, Cossette.
Por dois séculos e meio a alma da menina vagou, procurando por alguém que pudesse enxergá-la. Eiri Kurahashi seria o homem a preencher os requisitos: um artista talentoso que se apaixonara por Cossette; supostamente um herdeiro da alma de Marcelo. Perdido em devaneios apaixonados, Kurahashi vagueia entre sua identidade e a de sua alma reencarnada, ao mesmo tempo em que passa a ser receptáculo dos pecados do assassino de Cossette.
E é desta maneira que podemos delinear as três etapas que dividem a trama de Le Portrait de Petit Cossette.

REVELAÇÃO, CONHECIMENTO E DESPEDIDA
O anime tem boa noção de escopo; ele tem noção do tempo que dispõe e o usa bem, sem desperdícios. O primeiro episódio te deixa suspenso pela sensação do desconhecido, que é aliviado ao final. Já no segundo episódio, vemos um Kurahashi de cabeça funda nas novas circunstâncias de sua vida, ao ponto de preocupar seriamente as pessoas à sua volta, que tentam ajudá-lo. A sensação é a de que acompanhamos o desenrolar dos mistérios de Cossette lado a lado com o próprio protagonista. E é interessante, quando não comovente, ver um rapaz perdidamente apaixonado ao ponto de aceitar de bom grado a maldição que lhe é imputada. Principalmente depois de, durante um acesso de rebeldia, perceber o quanto que a alma de Cossette sofrera sozinha as dores do ressentimento.

Quando Cossette percebe que estava imputando responsabilidades a uma alma inocente, ainda que herdara a alma de seu amor, não se tratava do mesmo Marcello que a matou, a menina tenta devolver Kurahashi ao seu mundo. No entanto sua paixão o leva teimosamente de volta a ela, e é aí onde o anime realmente brilha.
E brilha como? Brilha ao tocar nas sensibilidades artísticas de Kurahashi. Cossette é um anime de suspense, mas também uma ilustração valiosa sobre as inspirações de um artista. Kurahashi herdou, supostamente, a alma de Marcello; e de fato ambos nutrem uma paixão enorme por Cossette. O que não fica claro, porém, é o quanto Kurahashi se apaixonara por sua musa por quem ela realmente era. A cada frustração na tentativa de desenhar sua inspiração mor no terceiro episódio, mais o rapaz percebe que ele estava apenas seguindo a sombra do assassino da garota, ao ponto da obra “Cossette”, de Marcello Orlando, assumir a identidade da menina que esteve uma vez entre os vivos.
É quando Eiri Kurahashi rompe com a sua inspiração e resolve desenhar Cossette pelas suas próprias mãos, pela sua própria ideia de quem era essa menina durante esse tempo todo, que a maldição é desfeita e o sobrenatural dá lugar à normalidade.

SONS FAMILIARES
Surpreendentemente, quando se espera de Le Portrait de Petite Cossette um anime sem pé nem cabeça, ele recompensa os pacientes com uma historieta simples, mas bastante efetiva.
E se você começar a assistir o anime agora e ouvir sons muito, mas muito familiares, não, você não está ficando louco. Caso você já tenha assistido animações como Fate, Kara no Kyoukai, Madoka ou é velho o suficiente pra ter assistido Noir no Animax, seus ouvidos vão perceber sim que a trilha sonora de Cossette ficou nas mãos da inconfundível e talentosíssima compositora Yuki Kajiura. Está ali uma receita única de coros etéreos, com violinos e fortes batidas de baixo e violão, criando uma ambientação simultaneamente única e familiar para os admiradores da compositora.

O autor deste Review agradece expressamente à recomendação feita por Claudinha, que conhece bem sua predileção por histórias de vingança. Pudim!