É hora de falar de uma das maiores joias do ano. Demon Slayer somou uma animação impecável com personagens bastante carismáticos, tão encantadores quanto diversos.

O que dizer desse espetáculo visual? Enquanto a internet enlouqueceu com a qualidade aberrante do episódio 19, a neve do primeiro episódio já me deixava de boca aberta desde a estreia. A notícia de que Demon Slayer seria animado pelo mesmo estúdio Aniplex/ufotable, que vem animando as maiores pérolas de Fate (Zero, Unlimited Blade Works e Heaven’s Feel), virou um ótimo incentivo para acompanhar um anime com temática folclórica.

ONIS RONDAM A TERRA

O folclore japonês já é um alvo fácil da minha atenção, não à toa já falamos aqui de animes como Dororo, Angolmois e Tsukumogami Kashimasu. Todos esses animes se passando em diferentes tempos do Japão: as guerras feudais, as invasões mongóis, o shogunato Tokugawa, etc. Dessa vez o cenário é a Era Taisho, no comecinho dos anos 1910. Um Japão pouco a pouco modernizado, mas que ainda conhece bem seus velhos modos no interior. E seus demônios.

No mundo além do que é possível de ver nas estradas de ferro e nas cidades movimentadas, os oni ainda são uma realidade e uma ameaça às pessoas que lhe servem de alimento. Os oni são criaturas sobre-humanas, com sede insaciável de carne humana para sobreviver e com uma fraqueza instantânea à luz do Sol, obrigando-os a viver nas sombras.

A realidade dos oni é imperceptível para a maioria das pessoas. Tanjiro, nosso protagonista, só toma noção dela quando sua família já está dizimada e ele é atacado pela sua irmã, Nezuko, que parece completamente diferente, gigante e quase monstruosa. O excepcional, aquilo que faz toda a diferença, como todo bom shounen que se preza tem, é o fato da irmã não ceder aos seus novos instintos de oni. Seu amor pelo irmão e pela falecida família a impede de ir às últimas consequências, como bem mostra seu rosto coberto de lágrimas, tentando lutar contra si mesma.

Assim, Demon Slayer conta a história de Tanjiro Kamado e sua busca por um jeito de fazer Nezuko voltar ao normal. Ela com o passar do tempo aprende a controlar sua própria fome, hibernando durante boa parte do tempo, sem nunca tomar uma gota de sangue humano sequer. Podendo tomar o tamanho que quiser, ela pode desde ficar enorme do tamanho de um homem adulto, como pode virar uma coisinha pequenininha cute cute que cabe numa caixinha. Assim viajam os dois irmãos.

POR QUE TANTO SUCESSO?

Mas quem se importa com tanto detalhe? O gênero de animes históricos não é lá dos mais populares. E animação por animação, se qualidade determinasse fama, Fate seria bem mais famoso do que é agora (mais graças ao jogo mobile do que aos animes, verdade seja dita) e The Garden of Sinners seria uma das animações mais celebradas de nossa época.

Nada disso acontece (infelizmente, é verdade). Mas então por que tanto sucesso? É verdade que a sequência de golpes de espada flamejantes e jogos de câmera estonteantes no episódio 19 foram coisas fora do comum, mas o que estava por trás dessa cena impactou mais do que ela em si mesma.

Era o fervor de Tanjiro em proteger sua irmã mesmo com uma espada quebrada. Ou o instinto de Nezuko em proteger seu irmão, despertando técnicas que nem ela mesma sabia que podia usar até aquele momento de urgência. Era aquele laço fraternal levado ao limite e se superando que, aliás, é outra marca registrada de um shounen: ir adiante, ir além, se empurrar para novas alturas na frente do impossível.

Com esse choque, que serviu para trazer ainda mais gente para o anime e fazer quem assistia vibrar ainda mais, outras qualidades ficariam ainda mais visíveis.

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Demon Slayer (Imagem Divulgação)

TANJIRO E SUA COMPAIXÃO

Além desse laço fraternal, vale também mencionar que Demon Slayer tem uma ótima construção de personagens. Peguemos Tanjiro, por exemplo. Ele é um protagonista de shounen por excelência: sempre sorridente, sempre esperançoso, sempre de bom humor. O garoto é quase um siscon, de tanto que ama Nezuko e ai de quem falar mal dela, vai levar uma cabeçada. Mas acima de tudo, o que torna Tanjiro especial é a sua misericórdia.

É verdade que depois da enésima vez, toda aquela história do oni ter um passado triste, que “explicaria” sua monstruosidade cansa, quando não soa condescendente. Tiques gastos à parte, a compaixão irrestrita de Tanjiro não deixa de ser um ponto forte no personagem, desde o oni das mãos, nos primeiros episódios, até o momento mais emocionante do anime, para mim, no arco das aranhas.

Sim, o episódio 19 foi lindo, mas uma cena logo antes, quase levou às lágrimas. Quando Tanjiro está prestes a derrotar a oni das marionetes, ela finalmente vê a chance de se ver livre do Rui e sua família distorcida, recebendo a morte literalmente de braços abertos. Incrivelmente, Tanjiro percebe essa mudança de postura dela e muda sua própria postura, para poder dar uma morte na mesma medida de sua rendição.

Quem quiser, que reveja a cena. Ela foi absolutamente linda!

É muito sugestivo que Tanjiro domine a Respiração da Água ao mesmo tempo em que ele tem essas características tão puras. Afinal, a água é um elemento de purificação na espiritualidade japonesa. Podemos até imaginar esses espadachins como um tipo de exorcista, que não só livra o mal da terra em forma de oni, mas que libera sua alma para o samsara, a roda da reencarnação que gira até o momento do nirvana, da iluminação (o caso de Rui reencontrando seus pais no final é uma ilustração marcante disso)

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Demon Slayer (Imagem Divulgação)

COMPANHEIROS DE JORNADA

Inosuke e Zenitsu entraram aos pouquinhos no anime, somente no seu final é que eles formam um trio unido como os Três Patetas ou Lindinha, Florzinha e Docinho. Do momento em que eles começam a enfrentar missões até essa união consolidada, vemos como Zenitsu é o mais próximo de todos em Demon Slayer; talvez nem tanto por ser um mulherengo irremediável, mas ele é um medroso como pouquíssimos de nós não seria se tivéssemos onis atrás de nossas cabeças.

O que pouco se esperava é o quanto esse medroso alívio cômico ficaria roubado de forte quando desmaiado. A primeira vez em que ele usa sua Respiração do Relâmpago, o battoujutsu que lembra muito um Kenshin Himura (Rurounin Kenshin) também foi um dos melhores momentos da animação desse anime.

Inosuke é a besta fera brigona do grupo. Mas mesmo procurando briga, uma hora essa mania também virou um alívio cômico. É engraçado como Demon Slayer consegue inserir momentos de comédia logo depois de uma luta intensa e ainda soar natural, nada forçado. No final das contas, estamos todos nos identificando com o Inosuke depressivo na cama. “Desculpa, sou fraco…”.

Todos somos Inosuke. Todos somos.

Duas personagens também foram a estrela guia do anime nos seus últimos episódios. Shinobu Kochou, a hashira das borboletas e usuária de veneno, tem um jeito tão sereno quanto denso; quando dublada por uma das vozes mais lindas de se ouvir hoje em dia, a de Saori Hayami (nossa Yumeko de Kakegurui), Kochou se torna hipnotizante, ainda mais quando conversa com Tanjiro, em meio à sua meditação. É nesse momento que Tanjiro desnuda sua personalidade impenetrável e podemos ver como ela era diferente antes de sua irmã mais velha morrer. Essa mudança da água pro vinho desperta mais curiosidade de uma das personagens mais encantadoras do anime.

E por falar em encantador, e o melhor casal do anime? É lógico que falo de Kanao Tsuyuri e Tanjiro. A pobre menina que de tanto ser privada das coisas, acabou perdendo até mesmo a própria vontade. Isso até Tanjiro começar a treinar e se aperfeiçoar em sua residência. Já na despedida, ele resolve apostar com uma moeda, a mesma que Kanao usa para se decidir, se ela passaria a decidir as coisas por si mesma. E verdade seja dita: sua reação não teve uma palavra sequer; mas todos nós sabemos o que aqueles olhinhos brilhando significaram.

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Demon Slayer (Imagem Divulgação)

Demon Slayer: CONCLUSÃO

O enredo de Demon Slayer é simples. Um irmão buscando por uma cura para sua irmã e derrotando vários oni no caminho até chegar no “chefão”. Nada de novo. E como já foi dito, a mania de mostrar o passado triste de cada oni desgasta rápido o enredo e os próprios vilões, que do nada deixam de ser vilões nos 45 do segundo tempo.

A verdade é que Demon Slayer fez fama graças aos seus personagens. Sua animação foi tão somente uma porta de entrada, por mais maravilhosa que ela tenha realmente sido e a história foi um grande “Quem liga?”. São personagens como Tanjirou, Zenitsu e Inosuke, a best imouto Nezuko (que tem um desing fora do comum), Shinobu e até mesmo seu vilão, Muzan, que realmente tem aura de vilão, que nos deixavam ansiosos em ver mais a cada semana. Não a toa já temos um filme anunciado, que irá cobrir todo o próximo arco do mangá.

E lógico, já temos gente dando spoiler, porque leitor de mangá não se segura no alto de sua superioridade transcendental. Mas se você conseguiu fugir dos spoilers até agora e não assistiu esse grande candidato a anime do ano, vá agora mesmo maratonar essa maravilha que é Demon Slayer.

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REVIEW
Demon Slayer (Kimetsu no Yaiba)
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Eriki
Olá, sou o Eriki, redator do Suco de Mangá desde 2018, ex apresentador do Gole Otaku, programa semanal do Suco de Mangá sobre as estreias de animes da temporada, formado em História pela UFRJ e guitarrista da Matina Cafe, banda que se inspira no som do visual kei.
demon-slayer-kimetsu-no-yaiba-reviewJapão, era Taisho. Tanjiro, um bondoso jovem que ganha a vida vendendo carvão, descobre que sua família foi massacrada por um demônio. E pra piorar, Nezuko, sua irmã mais nova e única sobrevivente, também foi transformada num demônio. Arrasado com esta sombria realidade, Tanjiro decide se tornar um matador de demônios para fazer sua irmã voltar a ser humana, e para matar o demônio que matou sua família. Um triste conto sobre dois irmãos, onde os destinos dos humanos e dos demônios se entrelaçam, começa agora.