De presença inédita no Brasil, o produtor Tetsuya Watanabe deu uma rara oportunidade de conhecermos mais a fundo o beabá de como um anime é planejado até chegar às telinhas.
Para muitos que, por exemplo, não entendiam muito bem a diferença de um diretor para um produtor, a palestra feita no Auditório ao longo dos dois dias do Ressaca Friends iluminou os presentes sobre o processo de criação de um anime, ou melhor, da possibilidade de sua produção, desde o ponto de partida.
O encontro
Tivemos o prazer e a alegria de conversarmos com Watanabe minutos antes de sua palestra com outros representantes de veículos de imprensa. Confesso aqui que a inversão da ordem, entrevista depois palestra, gerou um abismo de compreensão entre alguém que achava que fazia ideia do que que era um produtor para alguém convencido de que havia perguntado sobre coisas que não sabia bem ao certo.
A ideia aqui seria fazer um apanhado do que foi a palestra de Watanabe, mas ao fim e ao cabo, cheguei à conclusão de que eu com certeza jamais conseguiria superar a eficiência e a praticidade de um vídeo completo com a palestra na íntegra. E não digo isso em tom auto-depreciativo de todo, mas é que parte da graça da palestra é a oportunidade de testemunhar a eloquência fora do comum de Tetsuya Watanabe. O homem fala e fala e fala, com uma espontaneidade bem fora do comum quando se pensa na figura comum de um japonês, mais reservado e na sua.
Então, daremos um resumo a quem queira ver a palestra mais tarde, antes de apresentarmos um perfil resumido do produtor e a entrevista completa para os portais de imprensa. Neste bate-papo, aprendemos que o produtor é o elo que une as várias instâncias que compõe as etapas de criação e produção de um anime.
E isso vai longe: licenciamento para autorizar as produções, financiamento para custear as produções, marketing para projetar os retornos da iniciativa, escalação de diretores, animadores e dubladores. É trabalho pra mais de metro, que com certeza não é para qualquer um. Pois bem, prossigamos!
Sobre o Produtor
Antes de mais nada, uma palinha sobre o visitante. Anunciado como produtor de Captain Tsubasa 2002, Tetsuya Watanabe tem uma jornada vasta no mundo dos animes, principalmente durante os anos 2000.
Por isso, muito do que pode acabar sendo listado aqui pode não soar familiar, mas Watanabe ajudou na produções de obras como D.N.Angel, Monster Rancher, Paradise Kiss, xxxHOLIC the Movie, Kirby (aquele mesmo que passava na Jetix), além de outras coisas listadas em sua página na Anime News Network que são bem tanto-faz para muita galera aí com menos de vinte anos.
Para ficarmos nos exemplos mais ilustres, Watanabe também participou da produção da primeira temporada de Yu-Gi-Oh, Fullmetal Alchemist, o já mencionado acima Captain Tsubasa e dois filmes de Naruto, o Confronto Ninja no País das Neves e Prisão Sanguínea. Vale a pena notar que os cargos variam nessa lista.
Watanabe já foi produtor, mas também já foi gerente de programação, planejador, produtor executivo e cooperador de publicidade. Apesar dos nomes, tudo isso no final das contas é produção e envolve as várias etapas e frentes posicionadas para a produção de um anime.
Entrevista com a Imprensa
Acompanhado de Welton, intérprete que o acompanhou durante as atividades do evento, o Suco, em companhia de demais portais de imprensa, fez breves perguntas para Tetsuya Watanabe. Veja a seguir!
Boa tarde, prazer em conhecê-lo! Eu queria fazer uma pergunta relacionada à parte da produção do animes.
Como é que é feita a seletiva dos seiyuus, dos artistas que estarão participando por exemplo de One Piece, de Naruto, de algo que o senhor já chegou a fazer?
Tem vários pontos, mas o ponto mais importante é ver se o seiyuu, a pessoa que faz a voz, se ela combina com o personagem. Só que tem um porém também, se for um seiyuu de agenda cheia, fica bem difícil chamá-lo para o anime.
Os seiyuus geralmente gravam a voz de manhã e mais ou menos no período da tarde, só que se for alguém bem famoso, essa pessoa estará de agenda cheia. Então geralmente acabamos escolhendo dois ou três seiyuus e vemos qual deles tem a agenda mais tranquila. Há ainda uma questão financeira também. Os seiyuus são divididos em rankings, então tem vários rankings divididos e cada um tem o seu preço mais ou menos definido.
Então dependendo da empresa fazendo a parte de som, eles veem o quanto que eles podem bancar com esses seiyuus e vão decidindo. Havendo condições financeiras, se escolhe um seiyuu mais famoso; mas se não der, nós escolhemos alguém mais novato. E dependendo, tem as empresas que também falam, “Não, pega esse aqui!” e empurra o seiyuu.
Outro ponto é se esse seiyuu souber cantar e estiver numa empresa do ramo musical, costuma-se prestar atenção se ele ou ela sabe cantar ou não, pra daí talvez poder lançar cd’s, não com o nome do personagem dublado, mas lançado com o nome desse seiyuu. E aí nós prestamos atenção na agenda desse seiyuu, que pode ter os dias da semana mais cheios e os fins de semana mais tranquilos, mas ainda há a questão dos eventos promocionais. Se ele não tiver como comparecer nos eventos promocionais dos seus trabalhos, isso acaba nos impedindo de elencar esse seiyuu. Então são esses alguns dos fatores que pesam na hora de escolher um dublador para um anime.
Minha pergunta é bem pontual: o quanto que conhecer sobre futebol ajuda a produzir um anime esportivo como Captain Tsubasa?
Com certeza talvez ajude um pouco sim saber sobre os times e uma parte mais burocrática, mas sobre a relação em si… é uma questão um pouco complicada. Acho que isso vale não só para o futebol mas pra tudo, com certeza o quanto mais você soube sobre futebol mais fácil fica produzir um anime sobre esse esporte, assim como ajuda saber muito sobre animes no geral.
Qual foi o anime que mais deu dor de cabeça para dirigir e qual foi o anime que você mais gostou de dirigir?
Com certeza o que mais me deu dor de cabeça foi Yu-Gi-Oh (nota: ele se refere aqui ao Yu-Gi-Oh de 1998, da Toei), ele teve só duas temporadas e é mais antigo, então pouca gente o conhece. A dor de cabeça em si tem haver mais com a parte financeira. Os patrocinadores viram que o anime não estava dando muito certo e não continuaram com os patrocínios, por isso não vingou.
Já o anime que mais gostei de produzir, bom existem vários. Um deles é um anime chamado Jigoku Sensei Nube. Se vocês procuram por esse mangá na Jump, vocês verão que eu estou lá. Eu apareço nele como um dos personagens, o produtor malvado *risos*. Tem um outro anime chamado Hachimitsu to Clover. Ele foi um dos primeiros animes a estrear na parte da madrugada, na Fuji TV. Graças a ele outros animes começaram a serem transmitidos nesse horário, como Ano Hana. Essas estreias são transmitidas na televisão, então é importante pesquisar em qual horário eles deverão ser estreados e foi muito importante pra mim ter conseguido criar essa nova grade horária.
E tem mais uma menção *risos*. Eu gostei muito de ter produzido o live action de Sailor Moon. Existe uma atriz chamada Kitagawa Keiko, que na época do live action ainda era bem novata; e hoje em dia é uma das maiores atrizes do Japão. Eu penso nisso e fico “Puxa, era pra eu ter ficado mais amigo dela” *risos*.
Passado um puxãozinho de orelha no produtor, mas bem na amizade, para que ele pudesse dar respostas mais breves e assim dar espaço para outros poderem fazer suas perguntas, tivemos mais uma questão.
Eu queria saber como é produzir não só animes mas também produzir live-actions. Qual é a diferença entre um e outro para você?
São coisas completamente diferentes. Existem produtoras exclusivas a cada um desses segmentos, então produtoras de anime irão lidar apenas com animes e o mesmo acontece com live-actions. Então na hora que se decide em realizar adaptações, decidimos na hora se será feito um adaptação para anime, para live-action, ou para os dois.
O que te levou a ser um produtor? O que te fez querer atuar nessa área?
No começo eu trabalhava numa empresa de propagandas. Com o tempo me colocaram para trabalhar com propagandas de TV e de outros programas, uma coisa levou a outra e indo a fundo no ramo acabei trabalhando com produção de animes.
Através do seu legado, com certeza você inspirou vários outros jovens. Dentro desses deve ter um ou outro que vai querer seguir essa carreira. Qual a sua melhor dica pra quem estiver começando? O que você pode passar como experiência, o caminho das pedras por assim dizer?
Sim, eu com certeza quero ver animes sendo feito no Brasil. Aprender sobre animes e assisti-los bastante faz bem mas desejo antes de tudo ver esse tipo de produção por aqui!
A minha pergunta é se existe a possibilidade de vocês um dia trazerem seiyuus para visitarem o Brasil?
Dar até dá, mas como expliquei antes, a agenda desses profissionais costuma ser bem lotada. Se a gente for pensar em alguém mais famoso então, fica mais difícil ainda com uma agenda tão cheia. Eu já trabalhei em um programa com seiyuus então sei muito bem como é difícil acertar as agendas deles.