Em nossa entrevista exclusiva na BGS 2024 com o ator e dublador Roger Clark que deu vida a Arthur Morgan, de Red Dead Redemption 2, exploramos o universo multifacetado das atuações em videogames.
Ele compartilhou novidades sobre seus projetos atuais, como Rosewater, um jogo point-and-click no estilo western, e Evolutis: Duality, com uma estética cyberpunk. O ator também abordou as complexidades da dublagem versus a captura de performance, defendendo que ambas têm seu valor único na construção de personagens, destacando como a captura de movimentos exige uma intensidade de atuação que muitas vezes é mal compreendida pelo público.
Além de comentar sobre as técnicas de atuação, ele revelou inspirações que moldaram Arthur Morgan, como o lendário ator japonês Toshiro Mifune. Admirador da cultura japonesa, o dublador ainda mencionou seu gosto por animes como Death Note e Akira. Ao final, expressou seu carinho pelo público brasileiro, que o acolheu com entusiasmo em sua visita ao país.
Sou um grande fã de Red Dead Redemption especialmente, mas vi seu trabalho em Fort Solis! Gostaria de vê-lo em mais jogos! Tem algum jogo vindo por aí?
Claro! Tem um que vai sair ainda este ano, chamado “Rosewater”.
Ah sim, ouvi falar sobre este! É um point-and-click de faroeste, não é?
Você se lembra de Monkey Island? É igual Monkey Island, mas é um faroeste. Eu ainda não o joguei, não tenho ideia do que esperar, mas o que vi até agora parece bom. E tem mais um que fiz, chamado “Evolutis: Duality”, que tem uma vibe cyberpunk, estou ansioso por esse. Muitas outras coisas estão vindo, mas ainda não posso falar sobre o resto.
Já que estamos falando nisso, o trabalho neste adventure point-and-click será todo feito como dublagem, e não captura de performance, correto?
Sim, “Rosewater” é todo feito com dublagem.
Eu já vi você falando várias vezes sobre as diferenças entre dublagem e captura de performance. Você gostaria de explicar um pouco sobre isso para seus fãs brasileiros?
Sou muito apaixonado por captura de performance, e tantas pessoas ainda chamam todas as performances em games de “dublagem”. Isso não é mais verdade hoje em dia, nem mesmo metade das performances são meras dublagens. Captura de performance, se você ainda não conhecer, se você já viu gravações de bastidores de filmes como Avatar, Planeta dos Macacos… todos nós já vimos o Andy Serkis fazendo o Gollum, usando um spandex com as bolinhas, com uma câmera apontada na sua cara, trabalhando lado-a-lado com seus colegas, aprendendo suas falas… não poderia ser mais diferente de uma dublagem. São duas mídias completamente diferentes, que são vitais para performances em vídeogame, mas captura de performance não é dublagem, e dublagem não é captura de performance. Nós deveríamos parar de chamar todas as performances em vídeogames de dublagem, pois não é mais verdadeiro! Você pode chamar só de “atuação”, porque “captura de performance” é difícil de falar, mas se você falar “atuação”, nunca estará errado!
Você falou um pouco sobre vermos Andy Serkis atuando… uma performance que vi os bastidores foi a de “The Last of Us Part II”, e você trabalhou com o Troy Baker em Fort Solis. Como foi a experiência de trabalhar com outro ator do mesmo calibre?
Foi incrível! A aplicação de Troy, seu talento, sua experiência são inigualáveis. Foi ótimo conhecê-lo, nós trabalhamos juntos lá no Reino Unido, e ele realmente deu seu melhor em Fort Solis! Ele é um dos caras mais malvados que vi nos games em muito tempo, ele é apavorante nesse jogo!
Falamos um pouco sobre chamarmos tudo apenas de “atuação”. Você iniciou sua carreira no teatro. Quais você diria que seriam as diferenças e os desafios apresentados entre atuar para games e atuar no teatro?
Bem, no teatro o público está logo ali, então você pode aprender em tempo real o que está e o que não está funcionando. Para mim, o teatro foi o lugar perfeito para aprender o meu ofício e me tornar um ator melhor. Quando você está atuando num jogo, seja com dublagem ou captura de performance, com frequência demora entre um a dois anos para que o público comece a ver sua atuação, e até lá, é tarde demais para mudá-la. Sou muito grato por ter começado no teatro, pois puder ir aprendendo conforme trabalhei, e depois fui pro ramo dos games, uma vez que havia já desenvolvido um tipo de instinto.
Você ainda trabalha com teatro atualmente?
De vez em quando, sim. Eu estava fazendo “A Man for All Seasons” ano passado, e ainda gosto muito.
Um assunto inevitável é o da Inteligência Artificial, e dos impactos que essa tecnologia gerou nas questões trabalhistas para a área de captura de movimentos e dublagem em geral, inclusive gerando greves nos Estados Unidos. Qual é o seu posicionamento sobre este tema?
Minha opinião sobre IA mudou um pouco nos últimos anos. Quando começou, eu estava vendo isto ser usado, na maioria das vezes, para personificação, e, talvez uma palavra não muito mais gentil, mas tão correta quanto, que é roubo. Usando a imagem, a voz de outra pessoa e agrupando tudo como se fosse sua, eu não acho que essa é uma boa forma de criar arte. Hoje eu acho que a IA tem algumas aplicações muito úteis, eu só não gosto quando ela é usada para deturpar a voz, rosto, e performance sem seu consentimento. Mas ela está aqui, a gente gostando ou não!
Pois é, não podemos fazer a tecnologia andar pra trás.
Sim, e bem, ela vai tirar o emprego de alguns de nós? Sim, eu acho que sim. Definitivamente para personagens menores, talvez NPCs que não sejam tão relevantes para a história principal, sejam feitos com IA agora. Mas ainda não acho que elas podem competir com a engenhosidade humana, sabe? A IA usa aquilo que já foi feito e a reprocessa de forma criativa e rápida. Humanos ainda conseguem se inspirar. Não acho que IA pode ser inspirada ainda. Ouvi uma ótima citação outro dia: “Se você não se importa com criar, porque eu deveria me importar para assistir?”
Podemos agora falar um pouco sobre Red Dead Redemption, é um dos meus jogos favoritos, e acredito ser seguro dizer que Arthur Morgan é um dos maiores personagens no gênero western, não apenas nos vídeogames mas no cinema também. Quando você estava construindo o personagem de Arthur Morgan, você teve alguma inspiração em grandes atores como Clint Eastwood ou John Wayne?
Acho que minha maior influência foi este ator japonês chamado Toshiro Mifune.
Ah, de “Throne of Blood”?
Sim, você o conhece. Ele trabalhou muito com Kurosawa, fez “Sete Samurais”, “Yojimbo”, e tudo mais. Eu acho que ele era fantástico, e gosto muito que esse cara conseguia ser muito estóico e perigoso num minuto, e no próximo irreverente e engraçado, e eu queria incorporar isso para Arthur. Clint Eastwood não foi uma grande inspiração pois quando você assiste os filmes dele, ele mal fala! Eu adoro Clint Eastwood, não me entenda mal, mas eu me inspirei mais em John Wayne pois ele tinha um senso de humor, uma sagacidade. Então ele foi uma influência também. E claro, Rob Wiethoff, que fez John Marston.
Ele também é um personagem incrível. Quando você começou a trabalhar em Red Dead Redemption 2, você já havia se familiarizado com a narrativa e história do RDR1?
Sim, eu havia acabado de terminar o jogo, e um mês depois, fui para meu primeiro teste. Eu nem sabia que era Red Dead Redemption quando fiz.
Arthur convive com uma grande variedade de pessoas na gangue Van Der Linde. Qual personagem da gangue você diria que é o que você mais gostou quando teve a experiência da história do jogo?
Sou um grande fã do John Marston, gosto do Charles Smith, acho que essas foram algumas das melhores relações que Arthur teve. Obviamente Dutch e Hosea foram grandes influências também, mas a orientação do Hosea foi encerrada muito cedo, e o Dutch se tornou um pouco tóxico, então acho que John e Charles.
A nossa página, Suco de Mangá, trabalha com um foco ligado um pouco em games, mas mais aprofundado em anime e cultura japonesa em geral. O quão familiar você diria que é com animes e cultura japonesa em geral?
Eu amo cultura japonesa! Não apenas Toshiro Mifune, mas adoro ler sobre Miyamoto Mushashi, ele era muito legal. Anime, alguns eu gosto, mas alguns são meio juvenis para mim. Eu tentei One Piece, mas não consegui curtir muito. Death Note eu gosto, esse é pesado, achei que foi muito bem escrito. E claro, Akira, é um clássico.
Você gostaria de deixar alguma mensagem especial para os seus fãs aqui no Brasil?
Muito amor pelo Brasil! Estive impressionado desde que cheguei aqui, tem sido uma experiência incrível encontrar com todos vocês. Foras-da-lei pra sempre! Até a próxima!