Galera, deixem-me confessar um negócio aqui. Eu estou aqui, escrevendo coisinhas sobre games e música pro Suco de Mangá, mas eu nunca fui muito ligado nesse aspecto particular da cultura pop. Sim, eu sei, que que eu tô fazendo aqui, certo?
No entanto, meus camaradas sucolinos me informam que o Japão é muito particular a respeito do que constitui um gênero de mangá. O estilo de mangá Shonen (que literalmente quer dizer “jovem menino”) é especificamente direcionado à faixa adolescente masculina, e geralmente conta histórias de garotos alcançando a superação e aprendendo lições de vida através de aventuras cheias de perigos e lutas.
Já o estilo Seinen mira em jovens homens adultos, dos 18 a 30 anos, e não fogem da ação, mas adentram um pouco mais no horror. Inclusive, o anime que melhor conheço e gosto, Akira, pertence a este subgrupo.

Tem uma outra coisa que é cheia de gêneros e subgêneros bastante específicos, e dessa eu manjo um tanto: o heavy metal. Agora, o guarda-chuva do heavy metal é, de maneira geral, bastante dominado pelos homens, mas se eu tivesse que pensar em um gênero que é especificamente MAIS cheio de testosterona, acho que eu apontaria na direção do hardcore novaiorquino, popularizado em meados da década de 80 por bandas como o Sick of it All e o Madball, e que foi se fundindo no final dos anos 90 e dando origem ao metalcore dos anos 2000, talvez representado mais fortemente pelo Hatebreed.
O crescimento pessoal une o mangá e o hardcore
Acredito que essa banda é bem característica para demonstrar essa “energia de garoto adolescente” que faz parte do shonen. O Hatebreed tem como característica principal do seu som uma pegada “das ruas”, que costuma se cadenciar num tempo próprio para fazer a multidão pular, mas que também se acelera e se aproxima do thrash metal em rapidez.
É um som bastante centrado nesta guitarra cadenciada, sem muita técnica complicada, feita para que garotos extravasem energia através de rodas punk. Nas letras, mensagens de auto-afirmação, superação, e crescimento pessoal. Saca o que eles dizem na faixa Set it Right (Start With Yourself), do álbum mais novo Weight of the False Self, de 2020:
Se você acha que pode julgar alguém
Comece consigo mesmo
Se você quer tomar o controle
Comece consigo mesmo
Algo que você vê precisa de respeito?
Comece consigo mesmo
E se você quer mudar o mundo, você tem que
Começar consigo mesmo
Não parece algo que poderia ser trilha sonora da abertura de algum anime shonen? Mas peraí… e se eu te disser que tem uma outra banda que se inspirou justamente nisso?
A banda francesa Rise of the Northstar fará sua segunda visita ao Brasil no dia 18 de outubro, em São Paulo, no Fabrique Club. Composta pelo vocalista “Vithia”, guitarristas “Eva-B” e “Air One”, baixista “Yoru”, e baterista “Phantom”, a banda formada em 2008 representa essa mistura de culturas, pegando seu nome do lendário mangá Hokuto no Ken, e trazendo a expressão dos mangás shonen e seinen para um poderoso metalcore inspiracional.
Mais de dez anos de história
Conheci o grupo em 2014, através de um amigo, e naquela época, eles haviam lançado apenas o EP Demonstrating My Saiya Style, já deixando bem claro qual é o intuito do Rise of the Northstar: é botar a molecada pra girar, mas com uma pitada de anime. A introdução, Bejita’s Revenge, já deixa ali um nome característico pros fãs de Dragon Ball, e ilustra ainda mais a mistura de culturas, já que a letra é declamada em francês. A França é o segundo maior mercado consumidor de mangá e anime, perdendo apenas para o Japão. Explica muita coisa, não?
Através das seis faixas do EP, o Rise of the Northstar desce a pancada com seu metalcore denso, cheio de riffs cadenciados, bateria impactante, e até mesmo ousando flertar um pouco com o hip-hop e nu metal. O destaque do EP, sem dúvida, vai para a música título, que evidencia a inspiração do Hatebreed com uma letra inspiradora para o público-alvo dos shonen:
Respeite seus sonhos de infância
Pois você nunca esteve tão perto de si mesmo quanto nesta idade
Jovem, você aprende e busca
Mas às vezes você se perde e cai
Neste momento, levante-se e tome o controle
Escolha o caminho certo, caminho difícil, encontre um objetivo
Lute até morrer, proteja seus ideais
E faça seu caminho com espírito Saiya
Agora sim, metalcore novaiorquino e mangá japonês em harmonia, levando à explosão quando Vithia repete: “Encontre em sua mente a fúria Saiya!”
Explorando a discografia

Em 2014, a banda lançou seu álbum de estreia, Welcame, onde eles solidificaram o seu metalcore pula-pula e seu visual inspirado em personagens de mangás. Inclusive, a capa do álbum, que é muito reminiscente de capas de mangás como Great Teacher Onizuka e Slam Dunk, foi desenhada pelo próprio Vithia.
Uma das minhas faixas favoritas neste álbum é a Welcame (Furyo State of Mind), com suas transições entre uma introdução mais lenta, um riff avassalador incrível pra ser um início de show, um verso de hip-hop com guitarras cadenciadas, e uma ponte direto pro thrash metal. Dou destaque também para as brabas Samurai Spirit e Dressed All in Black.

Para o segundo álbum, o Rise of the Northstar deu uma guinada na sua produção e inspiração, contando com a parceria com o conterrâneo Joe Duplantier, do Gojira. Aquela banda que tocou na abertura das Olimpíadas esses dias? Sim, essa mesmo.
Com essa adição ao elenco, em 2018, foi lançado o exímio The Legacy of Shi, que, de acordo com Vithia, foi escrito para ser um álbum conceitual que trabalha com a ideia de um jovem sendo possuído por um yokai, uma espécie de espírito ou entidade específica da cultura japonesa.
Foi aprofundada ainda mais a influência da música japonesa, especialmente nas introduções e intermissões das faixas, e a mistura de hardcore, metalcore e hip-hop atinge mais forte do que nunca. Eu particularmente adoro as faixas Here Comes the Boom e Nekketsu.

O terceiro álbum, Showdown, de 2023, é um pouco mais comedido nas ambições, voltando para um hardcore um pouco mais cru e sem pretensões temáticas, mas misturando um pouco letras em inglês e francês, adicionando um ingrediente a mais nesse caldeirão. A capa do álbum traz uma nostalgia também dos games, lembrando muito as artes de jogos como Zone of the Enders. Neste álbum, destaco as faixas Third Strike e Rise.
2025 para o Rise of the Northstar
Além do show em terras tupiniquins, o Rise of the Northstar prepara-se para lançar um novo álbum no dia 14 de novembro, cujo título é uma doideira. O novo álbum se chamará Chapter 4: Red Falcon Super Battle! Neo Paris War!! (eu avisei) e já conta com alguns singles que estão disponíveis no Spotify, que prometem um trabalho explosivo e recheado de referências pro pessoal que curte os mangás.

As pancadas Neo Paris e A.I.R. Max fazem referências a Akira e Evangelion, respectivamente, e Back 2 Basics conta com a participação de outro grupo brilhante do metalcore francês, o LANDMVRKS.
O Rise of the Northstar se apresentará em único show no Brasil, no dia 18 de outubro, no Fabrique Club, em São Paulo.




