Em uma das participações mais legais da Bienal do Livro Rio 2025, o mangaká japonês Nagabe subiu ao Palco Apoteose Shell para conversar com os fãs sobre uma de suas obras mais conhecidas, A Menina do Outro Lado (Totsukuni no Shoujo). Com tradução ao vivo, o autor compartilhou os bastidores da criação do mangá, falou sobre sua trajetória, respondeu a perguntas do público e arrancou aplausos calorosos da plateia.
Sobre o gosto por personagens antropomorfos, ele contou: “Tive contato com esse tipo de obra na época da faculdade, já faz mais de dez anos. Desde então, queria trabalhar com o contraste do preto e branco nos desenhos”. E revelou algo pessoal: “Tenho alergia a bichinhos, por isso não pude ter animais de estimação, e isso me aproxima ainda mais de personagens como Shiva e Sensei, que também não podem se tocar”.
Já quanto ao sucesso internacional da obra, publicada em mais de dez países, ele respondeu: “Os personagens têm sentimentos e motivações, e eu quis que isso alcançasse leitores de qualquer parte do mundo. A conexão entre eles gera os conflitos, os diálogos, a história.”
Ao ser questionado se já sabia o final da trama desde o início, respondeu que tinha uma ideia geral: “Mas fui montando o caminho aos poucos, com partes tristes, divertidas, dramáticas, até chegar ao final.”
Um dos momentos mais aplaudidos foi quando ele comentou a respeito das tirinhas de humor ao fim de alguns volumes: “Eu colocava esses momentos para dar um alívio emocional ao leitor, especialmente depois de volumes muito tensos.”
Fãs quiseram saber como começar uma carreira como mangaká. O artista contou que estudava artes na faculdade e postava seus desenhos online, como um portfólio: “Foi assim que fui descoberto por editores. Usar bem as redes sociais é fundamental”.
A fã Marina perguntou sobre a inspiração para o Sensei. A resposta emocionou: “Eu observava o meu sobrinho pequeno, com três ou quatro anos. A inocência e espontaneidade da criança me fascinaram e inspiraram na criação da Shiva.”
Seguindo esta linha de pensamento, ao ser perguntado sobre a representatividade da escolha de Shiva como protagonista feminina em meio a tantos personagens principais masculinos, Nagabe respondeu: “Não criei a personagem pensando exatamente no gênero, do tipo que talvez uma mulher seria melhor, não foi isso. Eu quis colocar na história uma protagonista que mostrasse a inocência de uma criança. A Shiva é muito fofa, e se fosse um personagem masculino talvez seria menos fofinho, mas a ideia é realmente trazer a inocência da criança.”
Questionado sobre os cenários, explicou: “No início, eu não me achava bom em desenhá-los, então eu treinava com fotos e observando a natureza”. Sobre a técnica: “Eu ainda desenho tudo com nanquim, de forma analógica.”
Sobre o anime baseado em A Menina do Outro Lado, disse: “Não participei da produção, mas fico muito feliz com o resultado. A animação focou em detalhes delicados, como o cheiro da chuva, e trouxe uma sensação diferente, mas muito bonita.”
Fãs também perguntaram se haveria novos spin-offs como o seu recente lançamento Dear. “Eu tenho ideias, mas não estou certo ainda se irei desenvolver outras histórias no mesmo universo.”
Respondendo a Beatriz, que perguntou sobre bloqueios criativos, disse: “Quando isso acontece, o melhor é parar e fazer outra coisa: passear, jogar, conversar. A porta das ideias vive no nosso cotidiano. E sobre comparação, o ideal é se inspirar nos outros artistas, não se diminuir.”
Ao ser perguntado sobre inspiração, respondeu que “as ideias muitas vezes surgem quando estou vivendo algo interessante. Por isso, viajo, tiro fotos e registro sensações para usar depois nas obras.”
Sobre o tempo de produção, disse: “Um capítulo pode levar até um mês para ser feito. Tento equilibrar o tempo entre trabalho e lazer, mas o trabalho costuma vir primeiro.”
Matheus perguntou sobre o mercado brasileiro, e o ídolo respondeu: “Soube que o Brasil ainda publica poucos mangás de autores nacionais, mas sinto que o país trata com muito respeito as obras japonesas, com edições bonitas e cuidadas. Ficou impressionado com a edição em português da minha obra.”
Em um momento divertido, uma fã pediu para que Nagabe mandasse um beijo para a comunidade furry brasileira. Entre risos, ele prontamente atendeu ao pedido, arrancando aplausos da plateia com seu “beijo” simbólico para os furries (termo usado para pessoas interessadas em animais com características humanas, muito presentes na obra de Nagabe, como Smell).
E por fim, ao ser questionado se ele estaria do lado de dentro ou do lado de fora no mundo de sua história, sorriu e respondeu: “Acho que estaria do lado de fora. Melhor assim.”
Sob aplausos, Nagabe se despediu agradecendo ao carinho dos leitores brasileiros. Uma presença inesquecível para os fãs que viram de perto o criador de um dos mangás mais sensíveis e marcantes da década.
Nagabe na Darkside – Bienal do Livro Rio
Fotos por @fotobelga