Eriki
    Eriki
    "Um historiador apaixonado por uma boa leitura e guitarrista por hobby. Alguém que ama um bom slice of life e tem um vício crônico por jogos single-player. Me aventuro a compor pequenos poemas haiku e aprender mais da cultura e da sociedade japonesa!"

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    Migi & Dali | Review

    Flertando com o terror, mas cômico e sensível em sua essência, Migi & Dali honrou a memória de Nami Sano, talento marcante que tão precocemente deixou este mundo. Então, veja neste review o testamento de uma autora que ficou famosa por “Quem é Sakamoto?”. Também, que deixou uma história curta, porém robusta, sobre um mistério rondando os gêmeos Migi e Dali.

    Dois, unidos como um

    Num vilarejo fictício em Kobe, um casal idoso, carente de filhos, resolve visitar um orfanato para abrigar em seu lar. Assim, o casal Sonoyama se encanta com as crianças e as crianças, por sua vez, se animam com a possibilidade de uma família relativamente abastada acolherem elas.

    Então, saindo do orfanato, duas vezes Osamu e Youko Sonoyama encontram um rapaz belo e gentil. De fato, mais belo e mais simpático do que todas as crianças vistas ali até então. Assim, Hitori Sonoyama vira o filho adotivo do casal.

    Porém, ao contrário do que seu nome sugere, Hitori não é um só, mas dois. Desde a hora em que chegaram ao orfanato, Migi e Dali arquitetam um plano para se tornar o filho perfeito e voltar para o Vilarejo Oregon. Neste vilarejo a mãe dos meninos foi morta, então eles buscam executar sua vingança sobre o culpado.

    No entanto, como os Sonoyama só tinham condições de adotar uma única criança, os gêmeos contornaram a situação. Assim, fizeram o possível e o impossível ao melhor estilo Sakamoto para se passarem por uma pessoa só, Hitori Sonoyama.

    Drama e mistério

    Isto posto, Migi & Dali conta o desenrolar de um trágico mistério. A história de irmãos que são tão unidos que a única diferença entre eles é o lado para o qual cada um reparte sua frange: um à esquerda (migi, em japonês) e outro à direita (hidari, em japonês).

    Juntos eles formam um só (hitori, em japonês) na casa dos Sonoyama. Enquanto isso, investigam por conta própria as circunstâncias da morte de sua mãe, tendo um botão de pijama como única pista.

    Os trocadilhos japoneses aqui, simplistas a princípio, ganham contornos de profundidade com o passar da obra. Além disso, também vemos um desenvolvimento na personalidade dos irmãos, entre o apoio e o conflito, tão próprio de histórias de irmandade.

    Manipulando Expectativas

    Sendo assim, o desenrolar de Migi & Dali vai na contramão de boa parte das histórias de mistérios que costumam ser bem abertos e mal concluídos. Aqui, cada peça do quebra-cabeça é bem posta em cena, sem ser linear, mas sem dar meia volta rumo a lugar nenhum.

    A ambientação do anime joga com suas expectativas e te ludibria, seja pela lente da inocência dos gêmeos que não conseguem confiar em ninguém a princípio ou pela própria narrativa do anime que te pega de susto às vezes com personagens aparentemente suspeitos, mas que se revelam um doce. Por exemplo, a empregada Micchan ou o próprio casal Sonoyama.

    Largados à própria sorte no mundo depois que a mãe dos gêmeos é encontrada morta, Migi e Dali tem dificuldades de confiar nas pessoas à sua volta. Assim, o carinho dos Sonoyama e a eventual amizade feita com Shunpei, um maníaco por pássaros e aviação, transforma de pouquinho em pouquinho o anime de thriller cômico para um drama sensível sobre vínculos de confiança e como eles são construídos.

    A tragédia da perfeição

    Ao se aproximar da solução de seu mistério, Migi & Dali também mostra ser uma história bastante trágica. Apesar de haver sim um claro antagonismo em um de seus personagens, um olhar sensível sobre suas circunstâncias te deixa com a consciência embaraçada para apontar dedos.

    Como se o vilão principal do anime fosse uma série de infelizes coincidências. Para irmos a fundo nisto, alguns spoilers se mostram necessários. Quem não assistiu ainda o anime, sinta-se à vontade para pular direto para a conclusão.

    CUIDADO!! SPOILERS!!

    Quando descobrimos que o Vilarejo Oregon é meticulosamente vigiado pela família Ichijou, ou mais especificamente pela sua matriarca, Reiko, nós descobrimos que os eventos do anime são resultado das frustrações desenfreadas dela.

    Afinal, Reiko é uma mulher esmagada pelo peso da própria imagem de perfeição atribuída a si, que possuía tudo: beleza, status, riqueza, um ótimo marido. Porém, toda a riqueza do mundo não podia lhe trazer a maternidade, uma vez que Reiko era infértil.

    Esse “calcanhar de aquiles” na sua imagem e na sua expectativa de ser mãe, o passo final rumo à família perfeita, induz Reiko à medida desesperada de convencer sua empregada a deitar-se com seu marido e dar a luz a seu filho.

    Efeito dominó

    Porém, as consequências dessa decisão impulsiva são irreparáveis. O marido de Reiko percebe que a mulher com quem se deitava não era a sua e sim Metry, a empregada. Então, ele começa a nutrir sentimentos por ela, o primeiro baque na mente de Reiko.

    Em seguida, quando finalmente consegue engravidar, Metry dá a luz a não só uma como três crianças, sendo duas delas gêmeas e em nada parecidas com o pai. Desiludida, Reiko finge um parto imaginário e toma pra si a criança restante, longe do contato da mãe biológica.

    Afinal, agora Metry fica relegada a um quarto com os gêmeos que de lá nunca saem até o fatídico dia que ela consegue fugir da mansão dos Ichijou.

    No entanto, quando ela tenta resgatar o filho perdido, o menino, que nunca viu aquela mulher antes, num impulso de susto a empurra da janela, em direção à sua morte.

    Assim, uma sucessão de tragédias leva Reiko a sustentar uma rígida rede de mentiras a fim de proteger seu filho e a farsa de sua família perfeita. Uma teia alicerçada na ignorância irresponsável de seu marido e na vigilância de todo o Vilarejo.

    Então, o rompimento dessa teia implode a família Ichijou de dentro para fora. Além disso, defronta os gêmeos com o fato de que a morte de sua mãe é mais fruto de um trágico destino do que de uma malícia deliberada, e fragiliza seus planos de vingança.

    E como sustentam as boas histórias e a sabedorias dos antigos, a vingança se revela coisa jamais plena, que mata a alma e a envenena.

    Conclusão: In Memoriam

    O mangá de Migi & Dali terminou em 2021 e o anúncio de seu anime veio em fevereiro de 2023. Para a tristeza de todos nós, sua autora não pôde ver os frutos de seu trabalho animados, pois um câncer levou precocemente a mangaká de 36 anos no começo de agosto.

    Depois de ter marcado o mundo dos mangás e dos animes com Quem é Sakamoto?, ao menos Nami Sano teve tempo o suficiente para contar uma última história. Esta, por sua vez, foi ao mesmo tempo engraçada, bizarra, misteriosa, triste e, por último, bela.

    Pode ser que o julgamento deste review esteja nublado pela emoção pesada de ver um jovem talento falecer bem mais cedo do que o devido? Pode ser. Porém, é difícil negar que Migi & Dali seja um desses animes tão fissurantes que faz com que os episódios passem num piscar de olhos. Uma marca registrada de um anime que te fisga de jeito.

    Talvez seja por causa desse mesmo sentimento amargo de perda que a equipe tenha dado o melhor de si às vésperas da estreia para entregar uma produção digna do trabalho e da memória de Nami Sano.

    Que ela descanse em paz e que seu trabalho a sobreviva pelas décadas da história da cultura pop a seguir.

    Migi & Dali
    Imagem Divulgação

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    SINOPSE

    Após finalmente conseguirem adotar uma criança, os Sonoyama não estavam preparados para o mistério que logo se desvendaria. Hitori parece ser o filho perfeito para seus pais amorosos. Ele é bonito, inteligente e grato pela nova vida luxuosa que ganhou, mas ele guarda um segredo sombrio. Hitori, na verdade, são os gêmeos Migi e Dali fingindo ser um único garoto. E eles têm um motivo aterrorizante por trás dessa identidade oculta.
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