A nossa parceira, Editora JBC, trouxe para o Brasil a obra-prima do deus do mangá, Osamu Tezuka. Abordando reflexões sobre a vida e a morte, sustentabilidade, política e o tempo, Fênix é um mangá divertido, emocionante e muito instigante.
Originalmente publicado em 1954, o primeiro volume tem um tamanho generoso — 632 páginas. A sobrecapa com verniz aplicado e a capa de cores vivas e chamativas exibem a Fênix, pássaro que faz os principais acontecimentos da história se desencadearem. Claro, acompanha o marcador de páginas que se faz super necessário.
Mesmo com esse tamanho, não desanime! Fiquei me perguntando como um pássaro tão fofo poderia fazer um mangá tão profundo e me surpreendi.
Então, vem dar um bom Primeiro Gole nessa publicação que a JBC acertou em cheio trazendo para nós.
Enredo
O primeiro volume se divide em duas linhas do tempo, por isso, vamos em partes.
Arco da Aurora
Primeiro, acompanhamos Nagi, um garoto que vive em uma pequena vila, há milhares de anos atrás. Quando seu povo é atacado pelo reino vizinho, governado pela Rainha Himiko, ele é escravizado por Sarutahiko, em grande guerreiro.
Assim, ao invés de ser morto, Nagi treina o arco para capturar a Fênix para a Rainha, pois diz a lenda que quem beber do seu sangue terá a vida eterna. Porém, depois de um ato de traição, Nagi e Sarutahiko voltam para a aldeia destruída.
Enquanto isso, a Rainha começa a enlouquecer com sua a perspectiva de envelhecer, tomando decisões cada vez mais imprudentes. Seu reino começa a ruir internamente, mas cega diante de seu próprio desejo, Himiko move exércitos e não mede esforços para conseguir a Fênix.
Assim, uma trama política se desenrola junto da ambição de cada personagem, que por motivos diferentes buscam essa ave mitológica.
Arco do Futuro
Agora, num futuro muito distante, passado os anos 3000, conhecemos Yamanobe, um guerreiro da humanidade. Nesta época, existem apenas cinco megalópoles no mundo, escondidas embaixo da terra, pois a superfície já não é mais habitável.
Não há água, grama, animais ou qualquer tipo de natureza. Os humanos destruiram tudo com sua evolução desenfreada e irresponsável.
Nesse contexto, Yamanobe sai da segurança da cidade, pois guarda um moopy, ser que deveria ter sido exterminado anos atrás. Assim, ele vai parar em uma cúpula na superfície, comandada por um “cientista maluco” que tenta trazer vida de volta ao planeta.
Então, num encontro inesperado com a Fênix, o cientista tem a revelação que Yamanobe será o responsável por fazer do mundo um lugar habitável novamente e salvar a humanidade.
Porém, numa briga entre cérebros tecnológicos — diga-se inteligência artificial —, uma guerra radioativa catastrófica acontece. Isso faz com que Yamanobe se depare com uma realidade insuportável, insuperável e desesperadora.
Conseguirá ele, sozinho, desolado e meio enlouquecido, cumprir seu destino?
Temas super interessantes
Osamu Tezuka é um gênio. Meu primeiro contato com ele foi legal, mas o mangá não tinha sido tão impactante assim. Porém, Fênix me provou por que ele é chamado de deus do mangá.
A história traz reflexões tão profundas sobre nosso tempo estando vivos, sobre aproveitar a vida no seu sentido mais literal. Não “aproveitar” como, se divertir, sair em viagens, ganhar dinheiro, nada disso. Mas aproveitar estarmos vivos, valorizar a morte, pois é ela que nos move para fazer as coisas.
Por que essa busca maluca pela imortalidade? Ou esse medo tão profundo da morte? Não conseguimos valorizar os nossos dias vivos, viver no hoje como ele merece ser vivido?
Além disso, Tezuka mostra como os humanos simplesmente destruíram a terra. Tem momento melhor pra falar sobre isso do que agora? Ondas intensas de calor, queimadas no país inteiro, a qualidade do ar tida literalmente como insalubre. Ele escreveu o mangá em 1954 e agora, 70 anos depois, é doloroso ver que estamos nos preparando pra pular no precipício que Tezuka imaginou que iria surgir.
Também, Fênix traz algumas informações da história do Japão, falando abertamente que ela foi construída com invasão, guerra e genocídio. Inclusive, a história só não é muito pesada e gore por ser no traço do Tezuka. Tem muita — muita — morte, inclusive de bebês.
Conclusão
Essa publicação me surpreendeu de formas maravilhosas. Estava dando pouca coisa, mas recebi uma história que mexeu profundamente comigo. Apesar das polêmicas, a editora JBC deixou uma nota no fim do mangá sobre o Tezuka que chegou a me emocionar e clareou minhas ideias sobre o autor.
Fênix é sensível, inteligente, engraçada, ousada e cruel, pois mostra uma verdade que hoje está escancarada na nossa cara e nos recusamos a enxergar. Estou maluca pra ler o volume dois e digo pra você, leve um dia, uma semana ou um mês pra conseguir ler esse mangá enorme, mas cada página vale a pena.