Claro que o legado desta série não desapareceu, pois os personagens icônicos que foram apresentados lá nos tempos do Super Nintendo continuam agraciando os elencos dos times da série The King of Fighters. No entanto, o último jogo da série, o Garou: Mark of the Wolves, foi lançado lá em 1999. Temos membros do Suco de Mangá que são mais jovens que o Fatal Fury mais novo! E agora, depois de todo esse tempo, o novo Fatal Fury: City of the Wolves está aqui!
Eu consegui jogar um pouquinho dele lá na Brasil Game Show ano passado (e vocês podem ler as minhas impressões AQUI) e também consegui experimentar um pouquinho das versões beta do jogo que foram sendo disponibilizadas pela SNK, mas agora podemos passar um panorama completo do pacote que é City of the Wolves. Infelizmente, enquanto tudo que senti de positivo nas experiências antes do lançamento continuam sendo incríveis na versão completa do jogo, alguns aspectos do jogo parecem um pouco incompletos e/ou mal finalizados.
Vamos começar com a estrela do show: quando você está dentro da luta, a sensação de jogar City of the Wolves é, de todos os jogos de luta modernos, o mais oldschool. Isso pode, talvez, afastar alguns jogadores novatos, mas a galera que é 30+ e curte jogos de luta das antigas (ou, melhor ainda, se for fã do Garou) vai se sentir em casa. Isso se dá ao fato de que, ao contrário de jogos como Street Fighter 6 e Tekken 8, que adicionaram mecânicas que enfatizam um jogo mais agressivo e volátil, City of the Wolves traz de volta um jogo neutro mais focado em mecânicas defensivas e posicionamento.

City of the Wolves vai ser familiar para qualquer pessoa que tenha destreza com a série The King of Fighters. Temos quatro botões de ataque, bem como o botão de REV, que é o que permite fazer as coisas diferentes. Segurar esse botão nos dá uma defesa diferente que gasta a barra de REV para afastar mais o oponente ao bloquear ataques. Através dele, também temos movimentos que desviam de ataques altos e baixos, podemos reduzir a recuperação de alguns movimentos especiais para continuar combos longos, e também podemos usar “fintas”, onde o personagem faz uma animação como se fosse começar um movimento especial, mas não o termina. Isso é bom para provocar respostas do oponente, mas também pode ser usado para gerar pressão utilizando seus ataques.
Com esta descrição de apenas um botão, já dá pra se ter uma ideia da complexidade do sistema de combate de City of the Wolves, e eu ainda nem falei sobre boa parte das mecânicas! A barra de REV é bem parecida com o sistema de Street Fighter 6, sendo que ela permite que você cancele ataques especiais em outros ataques especiais para estender combos como achar melhor, mas se ela atingir 100%, seu personagem entra em superaquecimento, e aí fica sem acesso aos ataques REV, e também pode ter sua guarda quebrada. Para os jogadores de mais alto nível, o jogo também oferece a possibilidade de “just defense”, ou seja, bloquear ataques poucos frames do ataque atingir não gasta a barra de REV e ainda deixa você cancelar o bloqueio em ataques especiais.
A mecânica mais estratégica e mais complexa é o “Selective Potential Gear”, ou SPG. Você pode, no início de cada luta, posicionar o SPG no início, meio ou final da sua barra de vida, e quando sua vida estiver dentro do campo do SPG, você ganha acesso a dois novos ataques: o REV Blow, que é um ataque com armadura capaz de atravessar ataques inimigos, e o Hidden Gear, que gasta suas duas barras de especial para usar um Super com uma animação super intrincada que dá muito dano e recupera toda a sua barra de REV. Tudo isso leva a um jogo onde o posicionamento, as fintas, e a execução na hora de se defender são mais importantes do que pura agressão, e, por consequência, é um jogo mais difícil de se masterizar.

Agora, por mais que o ato de jogar City of the Wolves seja uma delícia, preciso falar sobre alguns aspectos que são menos favoráveis à experiência. Primeiro, visualmente, os personagens em si e seus ataques especiais e efeitos de partículas são vibrantes, super bem animados e abundantemente coloridos. Os cenários, por sua vez, também são ricos em detalhamento, cor e animação, mas é impossível de não notar que os personagens que estão lutando estão animados em 60 FPS, mas o cenário do fundo está animado em 30 FPS. Isso é especialmente notável num cenário que se passa num trem, onde há constante movimento no fundo, e isso infelizmente passa um aspecto de orçamento reduzido.
Esse aspecto de orçamento reduzido permeia a maior parte do conteúdo do jogo. Claramente inspirados no Street Fighter 6, a SNK adicionou, além do modo Arcade tradicional, um modo história chamado “Episodes of South Town”, onde podemos escolher um dos personagens e explorar a cidade, encontrando lutas e acompanhando uma historinha. No entanto, ao contrário do modo “World Tour” do SF6, nós só vemos um mapa da cidade onde pontinhos com “missões” vão aparecendo, e a história é contada apenas através de texto, nem ao menos tendo os quadros que aparecem no início e final do modo Arcade. Além disso, ele finge ser um modo RPG, como o de Granblue Fantasy Versus Rising, mas onde há muito pouca customização, apenas fazendo seu boneco ganhar experiência e dar mais dano a cada nível, e acrescentando alguns poderes como “dar mais dano com agarrões” ou “causar quebra de guarda ao acertar um just defense”. É um modo que rapidamente se torna enfadonho, fazendo você enfrentar os mesmos inimigos de novo e de novo, e às vezes adicionando regras estúpidas, como só permitir que você vença se for um Perfect.

Voltando um pouco aos aspectos positivos, posso dizer com satisfação que a experiência de jogar City of the Wolves online é tão boa quanto a de Street Fighter 6. A SNK, felizmente, implementou um sistema de rollback robusto, e ainda não tive nenhuma partida com muito lag ou onde notei muito rollback. Infelizmente, enquanto que para jogar partidas ranqueadas, o jogo me permite ficar dentro do modo treino, praticando combos, defesas e estratégias enquanto aguardo para encontrar jogadores, o online também evidencia que o sistema de menus do jogo é HORRENDO. Chamar amigos para participar do lobby é especialmente cruel, não permitindo que a gente encontre os amigos através do seu nick, mas sim através de um código que mais parece um número de celular. E aí, depois que você consegue chamar o pessoal anotando um monte de número, ainda tem que lidar com a interface do lobby, que faz você controlar um cursor de mouse com o seu analógico do controle. É uma das coisas menos intuitivas que já vi.
Para finalizar, eu não posso deixar de comentar sobre uma das coisas que mais me decepcionou sobre City of the Wolves, que é o seu elenco de personagens, em especial, as duas mais recentes adições. É claro que os personagens que retornam dos Fatal Fury antigos me enchem de alegria, e fico especialmente contente com o retorno da minha main, Mai Shiranui, que não fazia parte do elenco de Garou. Um elenco de dezessete personagens jogáveis no lançamento, com mais cinco a caminho na primeira temporada de DLC, também é um número saudável.

No entanto, a inclusão de representações do jogador de futebol Cristiano Ronaldo e do DJ Salvatore Ganacci são muito esquisitas. É evidente que estes personagens foram incluídos no jogo a toque de caixa, por ordem dos novos donos da SNK, a Fundação Misk, que tem ligação com o governo da Arábia Saudita. Desta forma, não deixa de ser decepcionante que personagens clássicos da série, como Andy Bogard e Joe Higashi, foram reduzidos ao status de DLC, enquanto um jogador de futebol que pouco tem a ver com o universo de jogos de luta e um DJ desconhecido são personagens de lançamento (e, pelo que observei dos recentes torneios, são personagens fortes). Isso pode ser um problema para os fãs mais antigos de Fatal Fury que gostariam de ver seus personagens favoritos de volta 26 anos depois, então peço que considerem esta questão antes de comprar.
Por fim, apesar de alguns problemas de apresentação e de conteúdo, Fatal Fury: City of the Wolves ainda é um jogo de luta moderno extremamente robusto, que tem tudo para entrar no imaginário da comunidade e ser competitivo e aclamado por muitos anos, trazendo a SNK de volta ao lado da Capcom e da Namco como os grandes devs do gênero.