O filme As Bestas, dirigido por Rodrigo Sorogoyen, inicia-se de maneira sutil e, ao mesmo tempo, intensa. Apresentando um grupo de homens subjugando um cavalo — uma bela forma de prenunciar o que vem por aí.
Enredo de As Bestas
Dois imigrantes franceses, Antoine (Denis Ménochet) e Olga (Marina Foïs) vivem em uma pequena comunidade espanhola. Eles tentam revitalizar o local para, quem sabe assim, evitar que as pessoas saiam e atrair moradores novos.
Quem dera fosse tão simples assim… os irmãos Xan (Luis Zahera) e Loren (Diego Anido) não veem a vida e as tentativas do casal com a mesma ótica que é apresentado ao público.
Essa dicotomia apresentada pelo roteiro de Isabel Peña e Rodrigo Sorogoyen é o fio condutor que leva a história adiante e a transforma em um thriller que, em certos momentos, flerta com o terror.
As escorregadias ruas de pedra que são as relações humanas
Para o casal, navegar entre as diversas relações humanas do vilarejo é difícil, assim como caminhar sob ruas de pedra após um dia de chuva.
Peña e Sorogoyen aplicam uma camada histórica, indo tão fundo ao ponto de citar Napoleão e a invasão à Espanha. Existe um latente preconceito por parte dos espanhóis que enraivece quem assiste, mas ao mesmo tempo levanta a dúvida: por quê?
O filme leva os irmãos a um fundo do poço moral através de atitudes desprezíveis. Arruinar a plantação do casal, assustá-los durante a madrugada, urinar em cadeiras de descanso e ameaçá-los em uma estrada escura são algumas delas.
Após todas essas atitudes, o filme desvenda a dúvida do porquê eles fazem isso. Os irmãos, e possivelmente outras pessoas do vilarejo, odeiam o casal pois eles prejudicaram a oportunidade de todos dali mudarem de vida.
Uma empresa éolica ofereceu uma bolada para cada pessoa vender seu terreno e sair da região e, durante uma conversa de bar, os Xan e Loren contam tudo isso e como Antoine e Olga arruinaram a esperança deles.
O intenso diálogo não serve como redenção aos irmãos, não. Apenas mostra o outro lado e o porquê dessa relação chegar a ponto de erupção.
A masculinidade é fundamental para o filme As Bestas
A violência física — ou a capacidade de — é mais associada ao homem do que as mulheres. O filme evidencia isso a medida que os atos se tornam mais violentos, além de as tentativas de Antoine defender a si e a sua esposa se tornarem mais extremas.
O filme também mostra isso através da imagem do homem viril, como uma besta. Músculos, pelos e outras características mais associadades ao sexo masculino contribuem para o enredo.
Quem realmente são as bestas?
Por fim, o filme descende até o ápice da violência e os irmãos acabam matando Antoine e escondendo seu corpo. O que não surpreende, dado o grau dos atos até então, mas funciona.
Nesse momento, o filme passa a focar no feminino, que ficava em segundo plano. A construção do enredo perde gradativamente a violência e entra em uma espécie de calmaria — de racionalidade.
Nem tudo pode ser resolvido com violência.
Olga segue em busca da verdade, por conta própria já que a polícia não ajuda em nada. Eventualmente a verdade vem a tona mas, antes disso, uma conversa com a mãe dos irmãos, expõe que a violência masculina acaba prejudicando outros ao redor.
A esposa sem o marido, a mãe sem os filhos.
Veredito
As Bestas vai fundo na violenta natureza humana. Sua lenta construção dá espaço para os personagens mostrarem o quão fundo podemos afundar. É violento, angustiante e, ao mesmo tempo, belo.
Talvez o fim do filme se torne deveras arrastado, o que pode cansar grande parte dos espectadores, mas de forma alguma tira os méritos da obra que encantou o Goya.