Há um fenômeno de interpolação de estilo entre obras audiovisuais ocidentais e séries e filmes produzidos no contexto asiático de BL (boys love) que vem chamando a atenção. Projetos recentes como Heartstopper, Young Royals, Love, Victor e, até mesmo, Vermelho, Branco e Sangue Azul espelham o imaginário de obras que são – na maior parte das vezes – adaptações literárias enxutas demais.
Quem acompanha BL sabe que a grande maioria das webséries tem origem tanto em novels (narrativa que transita entre conto e romance) quanto em quadrinhos (manhwa, yaoi, etc.), e que por isso precisam ser, quando lançadas, altamente generalistas, principalmente para se adaptar ao consumo imediato, gerando lucro para futuras produções do gênero
O formato
Nesse processo, grande parte da obra original acaba se perdendo, não pelo que já sabemos sobre a necessidade de mudanças em uma adaptação cinematográfica, mas por uma questão natural daquele cenário. Simbolizando um formato que, para quem não consome BL, acaba sendo um dos maiores pontos negativos na hora de analisar o que há de bom ou ruim em uma adaptação. Em outras palavras, qualquer um que não seja familiarizado com os BLs iria ter um treco quando soubesse dos malabarismos feitos para despedaçar uma narrativa e criar uma adaptação com aquilo que sobrou dela.
Se não bastasse esse formato, hoje utilizado em muitas séries e filmes do ocidente com temática LGBTQIA+, e que remetem a uma vertente do entretenimento asiático, produções como Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante, acabam sendo — na melhor das hipóteses — um grande triunfo exemplar para quem assiste BL, ou um completo horror para quem não faz ideia desse processamento. Essa dualidade de ser ruim para uns e extremamente bom para outros é a máxima que norteia o filme.
Pessoalmente, como leitor do livro responsável por esta produção, o filme corresponde bem ao seu cerne enquanto obra enraizada na paraliteratura. Ou seja, as expectativas não devem, em hipótese alguma, basear-se em obras de temática queer como as realizadas no passado ou até o final da década de 2010, como Brokeback Mountain ou Call Me By Your Name.
Novo espécime
Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante insere-se, portanto, neste novo exemplar cine-literário que, objetivamente, tende a ser simples, rápido e profundamente aliado aos maneirismos da dramaturgia LGBTQIA+. E não há como negar que isso, em parte, acaba dando certo. O filme acerta, com boas atuações de Max Pelayo e Reese Gonzales, em uma atmosfera solar e tipicamente preocupante de um romance coming-of-age.
É muito representativo, ainda que isso se deva à narrativa e não ao longa-metragem e seu roteiro, que às vezes é muito raso — outra característica que lembra muito os BLs por natureza. Mas, como esta adaptação não se insere no referido contexto das produções asiáticas, Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante só precisa servir de volume ao imenso interesse da indústria em aproveitar a exigência do público que cada vez mais anseia por peças desse tipo.
Hollywood está em declínio, perdeu o sentido de orientação há muito tempo, por isso não seria suspeito ou irrealista pensar que filmes como este — longe de grandes orçamentos e grandes estúdios — também partam do que outros polos cinematográficos do mundo tem a oferecer.